Em discussão na Câmara dos Deputados a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 282/2016, do Senado, que prevê o fim das coligações partidárias para cargos proporcionais e estabelece cláusula de desempenho para o funcionamento parlamentar, vem dividindo opiniões de cientistas políticos, dirigentes partidários e juristas. Segundo eles, se passar a vigorar a partir da próxima eleição, poderá fortalecer ainda mais os grandes partidos enfraquecer os pequenos, sepultar de vez as chamadas legendas de aluguéis e acabar com fenômenos eleitorais dos ‘puxadores de votos’, que apenas com sua votação ajudam a eleger candidatos de suas coligações com pouquíssimos votos.
Na Paraíba, se a proposta passar a vigorar, meia dúzia de partidos, que lideram as votações no estado, como PMDB, PSDB, DEM, PP, PT, PTB, PSB, PR, PSD não terão problemas para eleger seus parlamentares, com base nos históricos das últimas votações para os cargos de deputado federal, deputado estadual e vereador, que conseguem obter mais de 5% dos votos válidos. Só o PMDB foi detentor de quase 30% dos votos nas disputas proporcionais, seguido do PSDB, com 15%, e o PP com 10%.
Pela proposta, nas eleições de 2018, apenas os partidos que obtiverem 2% dos votos válidos em pelo menos 14 estados, com no mínimo 2% de votos válidos em cada um deles, terão direito ao fundo partidário, ao acesso gratuito ao rádio e à televisão e ao uso da estrutura própria e funcional nas casas legislativas. A partir de 2022, a cláusula de barreira subiria para 3% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos 14 estados, com um mínimo de 2% dos votos válidos em cada um deles.
A Lei 9.096/95, dos Partidos Políticos, já tinha condicionado o direito a funcionamento parlamentar ao atingimento pelos partidos da cláusula de desempenho, mas o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou esse artigo inconstitucional em 2006. Agora o assunto volta a ser discutido nessa PEC, já aprovada nos dois turnos pelo Senado, e para passar a vigorar já a partir das próximas eleições, terá que ser aprovada até o fim de setembro e sancionada um ano antes do pleito de 2018.
O advogado Newton Vita, presidente da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional da Paraíba (OAB-PB), ex-juiz do Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba (TRE-PB) e especialista em gestão pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), é a favor ao fim das coligações nas eleições proporcionais. Segundo ele, há várias propostas de mudanças em discussão, contudo muitas com poucas chances de aprovação. Existe consenso, de uma maioria, em alguns temas, como, por exemplo, a distribuição de verbas públicas para as legendas partidárias, a alteração do sistema de eleição para o Legislativo, bem como as regras de coligação entre partidos.
“O fim das coligações proporcionais, a meu ver, é bastante positivo, posto que, na prática, essas coligações não são realizadas em virtude de alinhamento ideológico, como deveriam ocorrer, mas decorrentes de acordos das mais variadas inspirações, que não transmite a vontade da legislação de submeter um pensamento comum ao eleitorado”, comentou.
Para Newton Vita, o fim das coligações proporcionais, trará benefício para os partidos mais bem estruturados, que possuem candidatos com votação mais expressiva. “Uma vez que, com o fim das coligações proporcionais, passará, na prática, a inexistir àquelas candidaturas que conseguem arquitetar suas eleições através de uma melhor coligação”, afirmou.
O presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-PB afirmou ainda que, com o fim das coligações partidárias, na prática, os partidos que não conseguirem atrair para seus quadros candidatos com votação expressiva e, desse modo, isoladamente, disputarem os pleitos eleitorais, fatalmente, para não saírem do cenário político, deverão se render às fusões, para o surgimento de uma nova agremiação, ou às incorporações, nas quais os pequenos e médios partidos serão incorporados por outra legenda, melhor estruturada e, assim, edificar sua eleição através dessa legenda. “Haverá muita discussão no Legislativo, sobretudo porque as mudanças pretendidas interferem diretamente na existência política dos parlamentares”, comentou.
O advogado Marcelo Weick, membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), acredita a proposta de reforma política que prevê o fim das coligações para cargos proporcionais não será votada em tempo hábil para passar a vigorar nas eleições do próximo ano, por conta da própria pauta de votação da Câmara dos Deputados e da crise política instalada no país, que deve impossibilitar a alteração das regras do jogo até o fim de setembro.
“O problema, é quando retornar do recesso parlamentar, a Câmara estará com as atenções voltadas para o pedido de cassação do presidente da República, Michel Temer, que terá que fazer muitas concessões para garantir votos a favor ou contra. Por isso, a probabilidade de votação da reforma política será mínima, porque infelizmente não será a prioridade para o momento”, comentou.
Weick ressaltou, no entanto, que a proposta vai fortalecer os partidos maiores e prejudicar os menores, porque a contagem matemática para cada partido eleger seus candidatos será diferente.
“O desejo de quem está trabalhando para acabar com as coligações proporcionais é exatamente o de reduzir o número de partidos políticos e vincular o desempenho de cada um, ao acesso ao fundo partidário e ao tempo no guia eleitoral”, explicou, afirmando que os representantes dos grandes partidos estão fechando questão para aprovação da proposta, que prevê ‘morte’ das coligações, exceto para as eleições majoritárias – presidente, governador e prefeitos – nas quais continuará valendo a união de partidos para eleger um candidato.
O cientista político Jaldes Menezes, professor do departamento de História da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e doutor em teoria política, pela Universidade do Rio de Janeiro (UFRJ), defende que a questão das coligações proporcionais no Brasil precisa ser repensada. Ele é a favor da manutenção das coligações nas eleições majoritárias de presidente, governador e prefeitos, as coligações permanecerem, o que é correto, pois atende o princípio democrático da possibilidade de existência de governos de coalizão.
Já em relação às coligações proporcionais, ele afirma que muitas distorções se acumularam ao longo dos anos, desde que, em 1979, ainda na ditadura, acabou o sistema bipartidário e retornou o pluripartidarismo. “É fato que as coligações entre partidos se transformou em uma grande negociata de compra de tempo de televisão e doação de dinheiro dos partidos e candidatos maiores aos partidos de aluguel. Tudo isso precisa acabar, contudo é preciso pensar como o fim das coligações deve ser feito, senão a emenda pode sair pior que o soneto”, comentou.
Jaldes chamou a atenção para o fato que, junto com a ideia do fim das coligações, aparecem propostas de cláusulas de barreira e modificações no sistema eleitoral. Segundo ele, a cláusula de barreira, desde que fixada em um piso razoável que permitirá a existência de um sistema de partidos com partidos grandes é médios, preservado um espectro ideológico amplo, pode ser uma medida interessante na formação de partidos verdadeiramente nacionais.
“Quanto ao sistema eleitoral, o sistema de voto em lista pode ser outra medida de fortalecimento dos partidos. Por seu turno, a ideia de ‘distritão’, também em discussão na comissão de reforma política da Câmara, é péssima. Pelo ‘distritão’, acabaria todo tipo proporcionalidade nas eleições de deputados – seriam eleitos, por ordem, os mais votados do Estado, independente das coligações partidárias. Na verdade, na prática, o ‘distritão’ aboliria na necessidade de partidos, que logo não teriam importância alguma na eleição”, opinou.
O presidente do PSDB na Paraíba Ruy Carneiro é favorável ao fim das coligações proporcionais. Segundo ele, é importante acabar com as coligações para fortalecer os partidos. “A medida fará como que se tenha uma vida partidária verdadeira no Brasil. O que existe hoje é uma salada partidária, com partidos de aluguel, que nas eleições majoritárias vão para lá e para cá, negociando tempo de televisão, o que é péssimo para democracia”, comentou o tucano.
O sistema atual
As vagas proporcionais – deputado federal, deputado estadual e vereador – hoje são distribuídas conforme o número de votos recebidos pela legenda ou coligação. A mudança tornará inútil a figura do candidato puxador de votos, que atualmente é representado por algum político importante ou por celebridades. Quando foi aprovada no Senado, a PEC, ironicamente foi apelidada de ‘Lei Tiririca’, mas poderia ter sido ‘Lei Eneas’ ou ainda ‘Lei Clodovil’.
A PEC impedirá justamente a repetição do fenômeno representado pela eleição do cômico, deputado pelo PR de São Paulo. Tiririca teve 1,35 milhão de votos e ajudou a eleger candidatos com pouquíssimos votos, como Vanderlei Siraque (PT-SP), que somou 93 mil votos, menos que outros dez candidatos não eleitos. Ou até mesmo ou até registrado na disputa por uma das vagas da Assembleia Legislativa da Paraíba em 2010, onde o ex-deputado Toinho do Sopão, foi eleito com mais de 57 mil votos e ajudou eleger outros de sua coligação.
Em eleições passadas, outros puxadores levaram a Brasília uma bancada de candidatos nanicos, como Enéas Carneiro e Clodovil Hernandez, já falecidos, campeões de votos em 2002 e 2006, respectivamente. Há 15 anos, Enéas foi escolhido por 1,5 milhão de eleitores e puxou mais quatro deputados, incluindo Vanderlei Assis de Souza, com irrisórios 275 votos. Na época da aprovação da PEC, o então vice-presidente Michel Temer (PMDB), hoje presidente da República comemorou com a seguinte declaração: “Chocante! Alguém que teve 128 mil votos não pode decidir em nome do povo, e quem teve apenas 275 pode”.
Pela proposta do fim das coligações proporcionais, os partidos não irão mais buscar nomes que possam trazer muitos votos, nem vão procurar um grande número de candidatos para fazer 2,3 mil votos ou menos, só para engordar o coeficiente eleitoral. Além disso, as coligações partidárias vão ser tornar nas eleições proporcionais. Hoje, os partidos se aliam para formar chapas com o intuito de somar forças e produzir um alto coeficiente. Com a nova regra, uma aliança partidária não produzirá qualquer efeito positivo ou negativo.
CARIRI EM AÇÃO
Com Correio da Paraíba /Foto: Google
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