O juiz da 11ª Vara Federal determinou aos réus o ressarcimento integral do prejuízo ao erário, solidariamente, no montante de R$ 26.346; pagamento de multa civil, por cada um, no mesmo valor, com os acréscimos legais em conformidade com o Manual de Cálculos da Justiça Federal; suspensão dos direitos políticos por oito anos, a ser comunicada ao TRE, após o trânsito em julgado; perda da função pública, também após o trânsito em julgado da sentença; além de proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.
Segundo as investigações realizadas pelo MPF, inclusive com atuação de instrução e investigatória in loco, a prefeitura faturava gêneros alimentícios da agricultura familiar em quantidade maior do que a efetivamente entregue nas escolas.
O esquema foi descoberto a partir de denúncia em que um agricultor afirmou ter sido procurado pela prefeita e pelo então secretário para ter o nome utilizado como fornecedor de merenda escolar do município, por ser ele portador da declaração de aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), que o habilita a fornecer produtos para a merenda escolar dentro do Programa Nacional de Alimentação Escolar.
Os agricultores recebiam os valores depositados pela prefeitura em suas contas correntes como “pagamento” pelo fornecimento de produtos e assinavam recibos. Sacavam o dinheiro e devolviam à prefeitura. Em troca, recebiam um pequeno valor pela utilização do próprio nome no esquema de desvio. Ao serem ouvidos pelo MPF, quase todos declararam ter entregue alimentos ao município, mas não na quantidade que constava nos documentos da prefeitura.
Compras – Conforme registros obtidos nas duas únicas escolas da zona urbana, de 817,8 kg de carne caprina empenhados, apenas 140 kg chegaram nas escolas; de 28,85 kg de feijão empenhados, nenhum foi entregue; de 643 kg de polpa de frutas compradas, apenas 85 kg chegaram aos copos das crianças. A prefeitura comprou 823 kg de frango, mas as escolas da zona urbana receberam apenas 100 kg. Foram comprados 450,2 kg de bolo caseiro, mas entregues apenas 110 kg.
Para desvendar o esquema, o MPF realizou diligências em escolas do município, colhendo depoimentos de professores, funcionários e merendeiras, bem como ouviu agricultores contratados para fornecimento de merenda escolar pela prefeitura de Livramento, no ano de 2014. Além disso, obteve acesso a todos os registros de recebimento de merenda escolar da agricultura familiar, no referido ano, nas duas escolas da zona urbana, que são as maiores do município e reúnem 73% dos estudantes da rede municipal de ensino.
Em 2014, o município de Livramento recebeu R$ 132.228 do PNAE e, de acordo com a Lei n.º 11.947/09 (que dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica), deveria ter utilizado, no mínimo, 30% desse valor na compra de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar. No entanto, o município empenhou apenas R$ 37.637,15 na aquisição direta aos agricultores, o que equivale a 28,46% dos recursos.
A sentença – Na sentença, o juiz ressalta que a prova documental constante dos autos é bastante contundente, evidenciando a diferença entre o valor empenhado para aquisição de alimentos supostamente entregues nas escolas e as quantidades de alimentos efetivamente entregues.
Segundo o juiz, “a prefeita prestou depoimento frágil, não sabendo explicar a divergência encontrada quando do cruzamento dos dados, limitando-se a alegar que a entrega dos alimentos ficava a cargo da Secretaria de Educação”.
“Conclui-se, portanto, da análise da prova documental carreada aos autos e do material probante colhido na instrução processual, que os réus praticaram fraude no fornecimento de merenda escolar por parte da agricultura familiar no município de Livramento em 2014”, segue a sentença.
“É imprescindível registrar que o dolo de enriquecimento ilícito por parte dos réus restou demonstrado pela característica da própria conduta descrita na espécie, que não é do tipo que poderia acontecer por mero descuido ou negligência, sem que houvesse um desígnio de enriquecimento ilícito por trás delas, já que envolve o desvio de uma grande quantidade de verbas, todas de mesma origem, e que não se desviaram por acidente, já que sua malversação seguia um modus operandi. O conjunto probatório evidencia que os agricultores foram procurados por Carmelita Estevão Ventura Sousa e Leonardo Arruda Ventura que, agindo de forma consciente, propuseram a sua participação no esquema fraudulento de desvio de verbas, emitiram empenhos e outros documentos ideologicamente falsos, atestando a compra de quantidades de alimentos muito superiores às efetivamente adquiridas, depositaram o dinheiro nas contas dos agricultores participantes do esquema, e, ainda, exigiram que os agricultores devolvessem a maior parte desse dinheiro, ficando com apenas R$ 200 cada um. Os réus não apresentaram qualquer elemento probatório que afastasse a conduta ilícita a eles atribuída”, declarou o juiz na decisão.
Ação nº 0800110-91.2015.4.05.8203S
Assessoria de Comunicação