Como Temer deve enterrar a segunda denúncia na Cãmara: nomeação para cargos e R$ 1 bi em emendas

Em busca de votos para derrubar o segundo pedido de denúncia da Procuradoria-Geral da República, o presidente Michel Temer investiu na liberação de dinheiro para obras de deputados federais, por meio do empenho de emendas parlamentares – quase R$ 1 bilhão em setembro e outubro – e fez uma série de nomeações a cargos do segundo escalão.

A expectativa do governo é que a Câmara dos Deputados aprove o relatório da Comissão de Constituição e Justiça que recomenda a rejeição da denúncia, mas Temer quer chegar próximo ao número de votos favoráveis obtido em julho, quando os parlamentares impediram que o presidente fosse processado criminalmente no Supremo Tribunal Federal.

Na época, 263 deputados votaram a favor de livrar Temer do processo, 227 votaram contra. Houve duas abstenções e 19 ausências. Para que a denúncia da PGR possa prosseguir, é preciso que 342 dos 513 deputados votem contra o relatório da CCJ que recomenda o arquivamento.

O governo teme que, na comparação com a votação anterior, mais deputados da base aliada e do próprio PMDB se ausentem da sessão desta quarta, diminuindo a margem de vitória.

A intenção é evitar que Temer saia enfraquecido da votação e perca fôlego para negociar a aprovação das reformas trabalhista e previdenciária- consideradas essenciais pelo governo para as metas de equilíbrio fiscal.

Nesta segunda denúncia feita pela PGR, Temer e os ministros ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral) são acusados de organização criminosa. Temer é acusado ainda de obstrução à Justiça.

À frente na lista de concessões em troca de apoio ao presidente, está a liberação de dinheiro de emendas parlamentares, que são recursos que os deputados alocam no Orçamento Federal para projetos em seus redutos eleitorais.

Só em setembro e outubro, o presidente liberou R$ 960,8 milhões – em setembro, foram empenhados R$ 273.394.568, e em outubro, R$ 687.460.176, segundo dados fornecidos à BBC Brasil pela Comissão Mista de Orçamento (CMO).

O partido que mais se beneficiou foi o próprio PMDB, com R$ 144,2 milhões em setembro e outubro. O PT, com R$ 106,6 milhões, e o PSDB, com R$ 101,4 milhões, foram segundo e terceiro maiores beneficiados.

É natural que essas três legendas, por serem detentoras das maiores bancadas da Câmara, recebam mais recursos, já que tendem a conseguir incorporar mais emenedas ao orçamento federal.

Os demais partidos que mais receberam dinheiro fazem parte do “centrão”, composto por legendas de médio porte que integram a base aliada de temer- o PP obteve R$ 99,3 milhões, seguido pelo PR, com R$ 71,4 milhões, e o PSD, com R$ 57 milhões. O DEM, importante aliado de Temer, vem em sétimo na lista, com R$ 55,7 bilhões.

A liberação de recursos só não foi maior que nos meses de junho e julho, quando Temer negociava apoio para se livrar da primeira denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República. Naqueles dois meses, foram empenhados mais de R$ 4 bilhões em emendas para projetos de deputados.

O volume liberado durante as negociações por apoio para a derrubada da primeira e segunda denúncia supera – e muito – os pagamentos somados dos meses em que o futuro de Temer não dependia tão diretamente do Congresso Nacional. De janeiro a maio, foram liberados, no total, R$ 102,3 milhões- valor bem menor que o pago entre junho e 23 de outubro- R$ 5,14 bilhões.

As transferências de dinheiro por meio de emendas são comuns em épocas de negociações intensas para a aprovação de propostas no Congresso Nacional ou em períodos de crise.

Em 2016, a então presidente Dilma Rousseff liberou, só em maio, R$ 3,8 bilhões em emendas- as negociações ocorreram exatamente no mês de votação do processo de impeachment pela comissão especial do Senado, etapa anterior à análise final do pedido de afastamento pelo plenário.

O pagamento das emendas parlamentares previstas no Orçamento é, atualmente, obrigatório, mas o ritmo é ditado pelo Executivo, que utiliza a liberação como instrumento de barganha em votações.

É comum que as liberações aumentem quando o ano vai chegando ao fim, mas, ainda assim, o volume de recursos liberados de junho a outubro de 2017 foi quatro vezes maior que o do ano anterior. Em 2016, foram empanhados, de junho a outubro, R$ 1,28 bilhões, enquanto, em 2017, o valor no mesmo período foi de R$ 5,14 bilhões.

Agrados à bancada ruralista

Além de transferências diretas de recursos a projetos de parlamentares, o governo Temer lançou mão de medidas apoiadas pela bancada ruralista, composta por cerca de 200 deputados federais- o suficiente para mudar o jogo a favor ou contra o presidente na votação da denúncia da PGR.

Uma delas foi a portaria do Ministério do Trabalho que altera as regras para a inclusão de nomes de pessoas e empresas na lista suja de trabalho escravo e flexibiliza conceitos sobre o que é trabalho forçado, degradante e trabalho em condição análoga à escravidão.

Na terça, a ministra do Supremo Tribunal Federal Rosa Weber suspendeu a aplicação das novas regras até o que o plenário do tribunal julgue se elas violam ou não a Constituição.

Outro aceno à bancada ruralista foi a assinatura de um decreto, na segunda-feira, que dá desconto de 60% em multas ambientais e que prevê que os recursos sejam usados para a prestação de serviços de preservação do meio-ambiente.

Nomeações

A BBC Brasil apurou ainda que, entre setembro e outubro, o presidente peemedebista também assinou uma série de nomeações para cargos do segundo escalão para atender, principalmente, a alas rebeldes do PMDB e aos partidos do “centrão”.

Temer se dispôs a receber pessoalmente deputados que o procuravam em busca de benefícios em troca de apoio, nos dias que antecederam a votação da Câmara.

Entre os esforços para atender a exigências de legendas aliadas está a nomeação do vice-presidente nacional do Solidariedade, Jefferson Coriteac, para a Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário, em 17 de outubro. O partido tem 14 deputados federais.

A pedido do líder do governo, André Moura (PSC-CE), e de outros parlamentares do PSC, Temer nomeou, também no dia 17 de outubro, Walterson da Costa Ibituruna para o cargo de diretor da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI). Ibituruna atuou como assessor parlamentar em gabinetes de deputados do PSC nos últimos cinco anos.

© BBC Temer assumiu pessoalmente negociações e recebeu demandas de parlamentares

Outra nomeação, publicada em setembro, que teria sido solicitada pelo PSC é a de Gedson do Nascimento Ramos para o cargo de superintendente na Bahia do Instituto Regional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O posto é considerado estratégico por influenciar na resolução de disputas fundiárias no Estado.

Também houve nomeação para agradar ao próprio PMDB, como a de Daniel Mamédio, ex-vice-prefeito de Itaquira (MS), para delegado federal do Desenvolvimento Agrário em Mato Grosso do Sul, cargo também considerado importante na resolução de conflitos agrários.

CARIRI EM AÇÃO

Com BBC Brasil/Foto: Reprodução BBC

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