Alçado ao comando da Petrobras em meio à crise gerada pela greve dos caminhoneiros, o presidente da estatal, Ivan Monteiro, defende a política de preços baseados em cotações internacionais como fundamental para manter a saúde financeira da companhia.
O tema se tornou parte do debate nacional e gerou temores de novas intervenções na gestão da companhia. Em junho, a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis) abriu consulta pública para estudar a possibilidade de limitar o prazo de reajustes.
Às vésperas da eleição, Monteiro diz que os candidatos à Presidência terão a oportunidade de comparar duas visões muito claras sobre a condução da estatal: uma que conduziu ao “desastre” e outra que levou à recuperação.
“Os meus primeiros 90 dias aqui foram dramáticos. Ninguém pode querer aquela situação novamente”, afirma o executivo, referindo-se ao início de 2015, quando chegou à empresa com a missão de calcular os custos da corrupção no balanço do ano anterior.
“Foi a ausência de interferência política que possibilitou a recuperação”, defende ele. Monteiro assumiu o comando da maior empresa do país em substituição a Pedro Parente, que renunciou após questionamentos sobre a política de preços.
O novo presidente diz que, assim como Parente, recebeu do presidente Michel Temer a garantia de que não haverá ingerência em sua gestão. Mas afirma estar aberto ao diálogo em relação à possibilidade de estabelecer periodicidade nos reajustes.
“O importante para a Petrobras é não perder a liberdade para praticar a política comercial mais realista possível”, diz.
Antes assumir a Petrobras na esteira da greve dos caminhoneiros, o senhor teve uma conversa com presidente Michel Temer, em Brasília. O senhor colocou condições para aceitar o cargo ou recebeu algum tipo de garantia?
O presidente me disse que todas condições que tinham sido dadas ao Pedro [Parente] —ausência de interferência política na indicação dos cargos de direção da empresa e na formação da política comercial – estariam amplamente estendidas à minha gestão. E, durante toda a gestão do Pedro, da qual eu participei ativamente, foi isso que ocorreu. Foram essas condições que possibilitaram a recuperação da Petrobras.
Logo em seguida, no entanto, a ANP abriu uma consulta pública sobre a periodicidade do reajuste da gasolina. Não é uma interferência na política de preços?
O diretor-geral da ANP [Décio Oddone] já disse várias vezes publicamente que não fará qualquer tipo de interferência na política comercial de qualquer empresa, não só da Petrobras. O que a ANP está fazendo de maneira democrática é, antes de publicar uma resolução, chamar uma audiência pública. E nós apoiamos plenamente esse processo. O importante para a Petrobras é não perder a liberdade para praticar a política comercial mais realista possível, não gerar uma situação em que a Petrobras fique em desvantagem em relação aos seus concorrentes e, evidentemente, não causar prejuízo à saúde financeira. No passado, isso aconteceu e foi desastroso para a Petrobras.
O sr. já citou a política de reajustes trimestrais de preços do GLP como uma alternativa encontrada para equilibrar os interesses do consumidor com a política de preços da Petrobras. Esse pode ser um modelo para os outros combustíveis?
Vamos aguardar o final da audiência pública. No caso do GLP, a Petrobras tomou a decisão de forma espontânea e foi muito adequada. A atuação da Petrobras é tão importante para a economia, que temos que levar em consideração o reflexo do que a gente faz. Tem que estar aberto a ouvir isso. A Petrobras tem que ter consciência de que impacta a vida das pessoas.
O ex-presidente Pedro Parente disse em sua carta de demissão que não queria ser um “empecilho à discussão de alternativas” para a política de preços. O senhor é mais flexível?
Não. Todas as decisões na Petrobras são colegiadas e são tomadas respeitando os pareceres das áreas técnicas. A imensa contribuição que o Pedro trouxe foi instituir um acompanhamento vigoroso à entrega do plano de negócios.
Antes da nossa chegada, a Petrobras prometia para o mercado uma curva de produção e não entregava, fez investimentos que tiveram consequências muito ruins para a companhia, como a refinaria de Pernambuco, o Comperj, [as refinarias de] Okinawa e Pasadena.
Mas é essa mesma companhia que descobriu o pré-sal. E hoje temos o imenso desafio de ser muito competitivos ou não vamos conseguir explorar economicamente os os ativos excelentes que temos no pré-sal.
Qualquer decisão tem que preservar saúde financeira da companhia e sua capacidade de ser competitiva. Vai ocorrer um grande leilão esse ano [o mega leilão do pré-sal, que o governo pretende realizar até novembro] e a Petrobras tem que estar muito bem financeiramente para participar desse leilão. Os investimentos serão muito expressivos.
O conselho de administração da Petrobras vem tentando blindar a empresa contra interferências políticas. Com as eleições, o sr. vê risco de mudanças?
Todos vão ter a oportunidade de acompanhar os resultados da companhia e verificar que ausência de interferência política é que possibilitou recuperação da saúde financeira da companhia. Isso é uma realidade. A Petrobras é uma indutora importante do investimento e tem um impacto muito positivo na economia, seja na geração de empregos e, principalmente, no aumento da arrecadação de tributos. Outro dado relevante são as mudanças no marco regulatório do setor, que aumentaram a atratividade e permitiram novas parcerias para investimentos. Acredito que nenhum candidato deixará de levar isso em consideração.
Mas é um momento de questionamento do uso que a Petrobras faz do monopólio, se beneficia mais o investidor ou a sociedade. E isso deve entrar no debate eleitoral.
A gente tem dois momentos muito claros. O momento em que a companhia viveu a maior crise da sua história e outro momento em que há plena recuperação financeira. Os meus primeiros 90 dias aqui foram dramáticos [a Petrobras esteve ameaçada de resgate antecipado de toda a sua dívida por não conseguir entregar seu balanço financeiro]. Ninguém pode querer essa situação novamente. Logo, teremos duas visões muito claras sobre isso: uma que foi um desastre e outra que vocês estão acompanhando.
A diretoria executiva da Petrobras falhou ao não prever que a política de reajustes diários dos combustíveis poderia gerar uma convulsão social se houvesse um repique de preços?
A minha resposta é não. É natural que em anos eleitorais haja volatilidade maior no câmbio, mas ninguém imaginava que o petróleo teria essa trajetória de crescimento que aconteceu. E isso ocorreu não porque o preço está respondendo a um cenário de oferta e demanda, mas por eventos de natureza política: as sanções ao Irã, a redução dramática da produção na Venezuela, eventos na Líbia, etc.
A Petrobras defende a criação de um imposto que suavize o repasse da volatilidade para o consumidor. Mas isso é factível numa situação fiscal tão apertada do governo federal?
Existem exemplos ao redor do mundo em que os governos fazem isso porque, quando ocorre aumento expressivo de preços do petróleo, há impacto relevante na inflação. E a resposta dos bancos centrais é subir a taxa de juros, o que gera um impacto negativo na economia.
Logo, é uma preocupação fundamental de todo governo o impacto do preço do petróleo não ocorra de forma tão dramática. Não estou falando em criação de novos tributos, mas em tributos já existentes, que podem funcionar como esse colchão para amortizar volatilidades. No Brasil, tem um imposto específico que foi criado exatamente para isso [a Cide, instituída em 2001], que deveria funcionar dessa forma.
As incertezas sobre reajuste podem prejudicar o processo de venda de participações em refinarias?
Insegurança sempre afasta investidores, que exigem um aumento da remuneração para aplicar o dinheiro. Para ter uma rentabilidade maior, utilizam uma taxa de desconto maior e reduzem o preço do ativo. O investidor que comparece a esses processos, no entanto, é de médio e longo prazo.
O processo de venda dessas refinarias foi interrompido por uma liminar da Justiça de Pernambuco e permanece parado pela decisão do STF (Supremo Tribunal Federal). Por isso, acredito que a decisão da ANP sobre a periodicidade do reajuste dos combustíveis virá antes, diminuindo toda essa incerteza.
A liminar [do ministro Ricardo Lewandowski, que estabele que toda privatização deve ser aprovada pelo Congresso] inviabilizar a meta de venda de ativos?
É claro que se tornou mais desafiador. O processo mais importante de desinvestimentos era a venda da TAG [Transportadora Associada de Gás, empresa que opera gasodutos no Norte e no Nordeste], que tem um valor de mercado bem expressivo. Quando vem uma decisão que posterga essa venda, a meta se torna mais desafiadora.
Mas quero enfatizar que outros componentes, que, no início do ano, não eram tão favoráveis, como o preço do petróleo, estão se comportando muito acima do que esperávamos. Ou seja, a venda de participações minoritárias em outros ativos, que continuam permitidas, podem ter um valor mais alto do que o previsto.
Além disso, a alta do preço do petróleo faz toda a diferença na geração de caixa. Ou seja, se temos um desafio maior nos desinvestimentos, também contamos um auxílio maior na receita, que nos ajuda atingir a meta de 2,5 vezes de dívida líquida/EBITDA [medida de saúde financeira de uma empresa].
Na divulgação dos resultados do segundo trimestre, vamos dar um pouco mais da visão prospectiva até o final do ano sobre qual deve ser o comportamento dessas variáveis, mas quero chamar a atenção para o fto de que nenhuma meta foi alterada.
O senhor chegou a Petrobras com Aldemir Bendine, com quem trabalhou no Banco do Brasil. Depois de deixar a estatal, Bendine foi preso pela Operação Lava Jato. O senhor teve conhecimento de alguma irregularidade?
Não, de forma nenhuma. Foi uma grande surpresa para todos nós.
CARIRI EM AÇÃO
Com Folha de São Paulo/Foto: Folha de São Paulo
Leia mais notícias em caririemacao.com, siga nossa página no Facebook, Instagram e Youtube e veja nossas matérias, vídeos e fotos. Você também pode enviar informações à Redação do Portal Cariri em Ação pelo WhatsApp (83) 9 9634.5791, (83) 9 9601-1162.