Procuradores criticaram Moro por questões éticas e adesão a Bolsonaro, mostram mensagens

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Procuradores do Ministério Público Federal reclamaram de violações éticas supostamente cometidas por Sergio Moro e temeram a perda de credibilidade da Operação Lava Jato com a ida do então juiz para o governo Bolsonaro, mostram mensagens privadas enviadas por uma fonte anônima ao The Intercept Brasil e divulgadas no início da madrugada deste sábado (29). 

De acordo com a parte 8 da série “As mensagens secretas da Lava Jato”, as conversas ocorreram em grupos com representantes da Lava Jato e outros integrantes do MPF (Ministério Público Federal) e revelam críticas duras à agenda pessoal e política de Moro, além de o acusarem de desrespeitar os limites da magistratura para alcançar seus objetivos.  

“Moro viola sempre o sistema acusatório e é tolerado por seus resultados”, disse a procuradora Monique Cheker pouco antes do juiz aceitar o convite de Jair Bolsonaro para ocupar o Ministério da Justiça. 

Nas conversas, os procuradores lamentam a proximidade de Moro com o presidente e dizem que isso daria força às alegações de que a Lava Jato teria motivações políticas.
Em conversas sobre a eleição presidencial, integrantes do MPF criticaram inclusive o fato de Rosângela Moro, mulher do ex-juiz, ter comemorado a eleição de Bolsonaro em suas redes sociais.

“Esposa de Moro comemorando a vitória de Bolso nas redes”, diz o procurador Alan Mansur logo após a eleição. “Erro crasso”, responde José Robalinho Cavalcanti, ex-presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República. “Moro já cumprimentou o eleito. Como perde a chance de ficar de boa, pqp”, afirma a procuradora Janice Agostinho Barreto Ascari. “Esse povo do interior é muito simplório”, ironiza o procurador Luiz Fernando Lessa. 

Para Janice, “Moro se perde na vaidade”. Procurador regional da 4ª Região, João Carlos de Carvalho Rocha concorda e vai mais longe: “Ele se perdeu e pode levar a Lava Jato junto. Com essa adesão ao governo eleito toda a operação fica com cara de ‘República do Galeão’, uma das primeiras erupções do moralismo redentorista na política brasileira e que plantou as sementes para o que veio dez anos depois”, afirma, em referência a um aparato militar montado pela Aeronáutica na Base Aérea do Galeão, em 1954, para interrogar suspeitos do atentado contra Carlos Lacerda na rua Tonelero, episódio considerado um dos estopins para o suicídio de Getúlio Vargas. Dez anos depois ocorreu o golpe militar. 

Segundo o Intercept, as conversas mostram que até mesmo Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa, demonstrou preocupação com a adesão de Moro ao governo Bolsonaro.

“…temos uma preocupação sobre alegações de parcialidade que virão. Não acredito que tenham fundamento, mas tenho medo do corpo que isso possa tomar na opinião pública”, afirmou. 

Alvo de críticas de Moro por seu desempenho em interrogatórios, a procuradora Laura Tessler também foi contra a decisão do ex-juiz.

“…além de ele não ter poder para fazer mudanças positivas, vai queimar a LJ (Lava Jato). Já tem gente falando que isso mostraria a parcialidade dele ao julgar o PT. E o discurso vai pegar. Péssimo. E Bozo é muito mal visto”…se juntar a ele vai queimar o Moro”, disse. 

Antônio Carlos Welter, integrante da Lava Jato, chega a dizer que a postura de Moro poderia ser considerada “incompatível com a de juiz” caso ele fosse para o governo.
Após Moro aceitar o convite para o ministério, as mensagens mostram críticas à atuação dele como juiz. Ângelo Augusto Costa, procurador do MPF em São José dos Campos, afirma em um grupo que não confia em Moro.

“Em breve vamos receber cota de delegado mandando acrescentar fatos à denúncia. E, se não cumprirmos, o próprio juiz resolve. Rs”, comenta. “Olha, penso igual, responde Monique, da Procuradoria da República em Osasco e Barueri. “Moro é inquisitivo, só manda para o MP quando quer corroborar suas ideias, decide sem pedido do MP (variasssss vezes) e respeitosamente o MPF do PR sempre tolerou isso pelos ótimos resultados alcançados pela Lava Jato”, ela completa. 

Segundo a procuradora, essa fama de Moro é antiga. Ela conta que, quando atuava no Paraná, em 2008, isso já acontecia.

“Alguns colegas do MPF do PR diziam que gostavam da pro atividade dele, que inclusive aprendiam com isso”, conta Monique.

“Fez umas tabelinhas lá, absolvendo aqui para a gente recorrer ali, mas na investigação criminal – a única coisa que interessa – opa, a dupla polícia/juiz eh senhora”, responde Ângelo Augusto. 

Outro lado Segundo o Intercept, o porta-voz da Lava Jato rebateu as novas revelações afirmando que as conversas podem não ser autênticas.

“O trecho do material enviado à Força-Tarefa não permite constatar o contexto e a veracidade do conteúdo. Autoridades públicas foram alvo de ataque hacker criminoso, o que torna impossível aferir se houve edições no material alegadamente obtido. A Lava Jato é sustentada com base em provas robustas e em denúncias consistentes, analisadas e validadas por diferentes instâncias do Judiciário. Os integrantes da Força-Tarefa pautam suas ações pessoais e profissionais pela ética e pela legalidade”, diz a resposta.

Também de acordo com o Intercept, a procuradora Monique Cheker disse não ter registro da mensagem enviada e, portanto, não reconhece a suposta manifestação.
O procurador regional Luiz Fernando Lessa disse que não possui mais o aplicativo Telegram nem as mensagens trocadas por meio dele e por isso não reconhece as conversas.

Os demais procuradores foram procurados pelo site e não responderam até agora.