O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, anunciou nesta terça-feira (8) que o Brasil estabelecerá como meta, no âmbito do Acordo de Paris, atingir a neutralidade nas emissões de gases causadores do efeito estufa até 2060.
A meta é a mesma já apresentada pela China, por exemplo. A União Europeia se comprometeu, em 2019, com uma data mais próxima: zerar o saldo de emissões de gás carbônico “já” em 2050.
Os detalhes da nova meta só devem ser divulgados pelo governo nesta quarta (9). O Acordo de Paris completa cinco anos neste mês e, por isso, todos os países signatários devem apresentar novas versões dos compromissos já assumidos.
O acordo foi assinado em 2015, durante a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climática. O texto fala em manter a temperatura do planeta com uma elevação “muito abaixo de 2°C” mas “perseguindo esforços para limitar o aumento de temperatura a 1,5°C”.
“A nossa contribuição nacional determinada (NDC) a ser apresentada, agora que aprovada pelo governo brasileiro, reafirmando os nossos compromissos, colocando o compromisso brasileiro com a neutralidade de emissões até 2060. E destacando também a possibilidade de este prazo ser reduzido consoante sejam implementados os mecanismos de mercado previstos no Acordo de Paris”, declarou Salles.
Ainda de acordo com Salles, esse prazo de neutralidade nos próximos 40 anos pode ser antecipado. Para isso, no entanto, o Brasil cobrará que os países desenvolvidos transfiram US$ 10 bilhões anuais para projetos brasileiros a partir de 2021.
Entenda como é o Acordo de Paris
Caso isso aconteça, a meta reduzida ainda será definida – Salles não informou o quanto o prazo poderá ser reduzido.
“Em anexo à nossa NDC […] nós explicitamos a forma que entendemos necessária, do ponto de vista de créditos e mercado para o recebimento dos recursos. Que pode se dar através dos mecanismos do artigo 6º do Acordo de Paris e do programa de pagamento de serviços ambientais, o Floresta+, à razão de 10 bilhões de dólares a partir do ano que vem”, disse o ministro do Meio Ambiente.
“Em havendo recebimento de recursos financeiros para estas destinações, nós consideraremos a hipótese de tornar nosso compromisso de neutralidade em prazo anterior”, prosseguiu.
Estudo diz que Brasil não conseguirá cumprir Acordo de Paris
Atualmente, o Brasil já tem duas metas relacionadas à redução da emissão de gases de efeito estufa no âmbito do Acordo de Paris:
- uma delas, mais impositiva, de chegar a 2025 com redução de 37% em relação aos níveis de 2005;
- outra, como uma “sugestão”, de chegar à redução de 43% na mesma comparação até 2030.
Para atingir essas metas numéricas, o país anunciou compromissos como o de zerar o desmatamento ilegal até 2030, reflorestar 12 milhões de hectares e assegurar 45% de fontes renováveis na matriz energética nacional.
Como país subdesenvolvido, o Brasil não é obrigado pelo Acordo de Paris a fixar metas numéricas, mas sim a continuar se esforçando de modo geral para a preservação do meio ambiente. As metas de Brasil, Índia e outros países do “terceiro mundo” são voluntárias.
Pedindo dinheiro de fora
Esta não é a primeira vez que o ministro Ricardo Salles fala em pedir US$ 10 bilhões anuais aos países ricos para investir em ações de conservação no Brasil.
Ainda em 2019, nas reuniões preparativas para a Conferência Internacional do Clima (COP 25) em Madri, Salles citou a cifra – que corresponderia a 10% do total previsto no Acordo de Paris de repasses de países desenvolvidos para países subdesenvolvidos.
Salles diz que vai cobrar recursos de países ricos para preservação do meio ambiente
As transferências estão previstas no Artigo 6º do acordo, que ainda não foi regulamentado. A ideia é que países de primeiro mundo – que têm áreas verdes menores e parques industriais mais antigos – “comprem” serviços ambientais nos países mais pobres, de modo a compensar a própria emissão de gases poluentes.
Apesar dessas declarações, mesmo o dinheiro que o Brasil já recebe de países europeus está paralisado. O Fundo Amazônia, um dos principais instrumentos para essas remessas, está interditado há mais de um ano.
Desde o ano passado, já na administração do presidente Jair Bolsonaro, o fundo se tornou alvo de polêmica. Maiores doadores, Alemanha e Noruega suspenderam os repasses ao Brasil em agosto do ano passado, quando as atividades já estavam paralisadas.
Na ocasião, o presidente Jair Bolsonaro desdenhou da decisão dos países europeus.
“A Noruega não é aquela que mata baleia lá em cima, no Polo Norte, não? Que explora petróleo também lá? Não tem nada a dar exemplo para nós. Pega a grana e ajude a Angela Merkel a reflorestar a Alemanha”, afirmou na ocasião.
Principais pontos do acordo
- Países devem trabalhar para que aquecimento fique muito abaixo de 2ºC, buscando limitá-lo a 1,5ºC;
- Países ricos devem garantir financiamento de US$ 100 bilhões por ano;
- Não há menção à porcentagem de corte de emissão de gases-estufa necessária;
- Texto não determina quando emissões precisam parar de subir;
- Acordo deve ser revisto a cada 5 anos.
Avanços no acordo
A última conferência do clima da Organização das Nações Unidas (ONU), a COP 25, terminou com os quase 200 países participantes concordando em apresentar “compromissos mais ambiciosos” para reduzir as emissões de gases poluentes.
Mas os detalhes sobre como isso será feito serão acertados somente na COP 26, marcada para novembro de 2021 em Glasgow, na Escócia.
Ricardo Salles sobre a COP 25: ‘Querem disfarçar a discussão sobre os combustíveis fósseis
A regulamentação do mercado de carbono previsto no texto do acordo, uma das decisões mais esperadas da reunião, também ficou para o ano que vem.
Ricardo Salles defende que o mercado seja regulado, o que segundo ele, traria mais recursos para investimentos na área do meio ambiente no Brasil. Após a COP 25, o ministro do Meio Ambiente disse que “a COP 25 não deu em nada”.
“Países ricos não querem abrir seus mercados de créditos de carbono. Exigem medidas e apontam o dedo para o resto do mundo, sem cerimônia, mas na hora de colocar a mão no bolso, eles não querem”, afirma Salles em uma rede social.
A atuação do Brasil na COP 25 se concentrou em pedir recursos dos países ricos para preservação no Brasil. Mas, nos últimos dias do evento, o país também protagonizou um impasse sobre artigos que tratavam da participação dos oceanos e o uso da terra nas mudanças climáticas.
Organizações sugerem medidas
O Observatório do Clima, rede de 56 organizações da sociedade civil, sugeriu que a nova Contribuição Nacional Determinada (NDC, na sigla em inglês) do Brasil para o Acordo do Clima de Paris deveria se comprometer a reduzir as emissões líquidas em 81% até 2030 em relação aos níveis de 2005. A proposta foi apresentada nesta segunda-feira (7).
Segundo o Observatório do Clima, essa redução significaria chegar ao fim da próxima década emitindo, no máximo, 400 milhões de toneladas de gases de efeito estufa. Atualmente, a emissão líquida do Brasil é de cerca de 1,6 bilhão de toneladas de gases – o país é o sexto maior emissor de gases do planeta.
Além da meta de redução de emissões, o Observatório do Clima também propõe que o Brasil adote uma série de políticas públicas que facilitam o cumprimento do compromisso, entre elas:
- Eliminar o desmatamento em todos os seus biomas até 2030;
- Restaurar 14 milhões de hectares em áreas de reserva legal e áreas de preservação permanente entre 2021 e 2030;
- Restaurar e recuperar 27 mil hectares em áreas de apicuns e manguezais entre 2021 e 2030;
- Recuperar 23 milhões de hectares de pastagens degradadas entre 2021 e 2030;
- Implantar 13 milhões de hectares de sistemas integrados de lavoura-pecuária-floresta (LPF) entre 2021 e 2030;
- Ter 80% das áreas de lavouras do Brasil cultivadas sob sistema de plantio direto até 2030;
- Aumentar em 2 milhões de hectares a área de florestas plantadas no período entre 2021 e 2030;
- Atingir pelo menos 106 Gigawatts de capacidade instalada de energia elétrica de fontes solar, eólica e biomassa em 2030;
- Ampliar a pelo menos 20% a mistura de biodiesel no diesel de petróleo (B20) até 2030;
- Eliminar os subsídios a combustíveis fósseis até 2030;
- Eliminar a entrada em circulação de novos veículos de transporte urbano de passageiros movidos por motor a diesel até 2030;
- Assegurar o desvio de pelo menos 8,1% de todos os resíduos orgânicos de aterros sanitários do país até 2030;
- Reciclar pelo menos 12,5% de todo o papel oriundo de resíduos domiciliares até 2030;
- Recuperar ou queimar pelo menos 50% de todo o biogás gerado nos aterros sanitários;
- Erradicar todos os lixões do país até 2024.
G1