Relator vota no STF a favor de medidas restritivas para obrigar vacinação contra Covid-19

O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quarta-feira (16) a favor de medidas restritivas indiretas a fim de obrigar a população a se vacinar contra a Covid-19.

Para o ministro, a vacinação obrigatória não significa a vacinação “forçada” da população.

Lewandowski é relator de duas ações que começaram a ser analisadas pelo plenário e tratam da possibilidade de governos federal, estaduais e municipais decidirem sobre a vacinação compulsória da população contra a Covid. O STF também deve decidir se pais podem deixar de vacinar os filhos com base em “convicções filosóficas, religiosas, morais e existenciais”.

Os demais ministros ainda devem apresentar seus votos. O julgamento foi suspenso após o voto do relator e terá continuidade nesta quinta-feira (17) com o voto do ministro Luís Roberto Barroso, relator de uma outra ação em análise.

No início da sessão, o ministro Luiz Fux, presidente do STF, afirmou que a expectativa é que o julgamento seja finalizado antes do recesso. A última sessão da Corte neste ano está prevista para a manhã de sexta (18).

Voto do relator

Em seu voto, o ministro Ricardo Lewandowski afirmou que a “vacinação compulsória não significa vacinação forçada, por exigir sempre o consentimento do usuário”, mas que pode “ser implementada por meio de medidas indiretas”.

Entre essas medidas estão a “restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes” e com respeito “à dignidade humana e aos direitos fundamentais das pessoas”.

O ministro defendeu que é “flagrantemente inconstitucional” a vacinação forçada das pessoas, ou seja, sem o seu expresso consentimento, mas argumentou que “a saúde coletiva não pode ser prejudicada por pessoas que deliberadamente se recusam a ser vacinadas”.

“A vacinação obrigatória no Brasil, desde há muito, é uma realidade”, afirmou. “Sob o ângulo estritamente constitucional, a previsão de vacinação obrigatória, excluída a imposição de vacinação forçada, afigura-se legítima”, acrescentou.

Lewandowski afirmou também que a obrigatoriedade não pode contemplar “medidas invasivas, aflitivas ou coativas” e deve obedecer a “critérios de razoabilidade e proporcionalidade”, além de estar amparadas em “evidências científicas e análises estratégicas pertinentes”.

Segundo o relator, as restrições podem ser implementadas tanto pela União como pelos Estados, Distrito Federal e municípios, em suas esferas de competência, pelo “dever irrenunciável do Estado brasileiro de zelar pela saúde”.

“A competência do Ministério da Saúde para coordenar o Programa Nacional de Imunizações e definir as vacinas integrantes do calendário nacional de imunização não exclui a dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para estabelecer medidas profiláticas e terapêuticas destinadas a enfrentar a pandemia decorrente do novo coronavírus”, complementou.

O ministro defendeu também que as vacinas sejam distribuídas universal e gratuitamente, com “ampla informação sobre a eficácia, segurança e contraindicações dos imunizantes”.

Advocacia-Geral

O advogado-geral da União, José Levi, pediu que as duas ações sejam rejeitadas, sob o argumento de que a vacina será naturalmente demandada pela população e que o governo já vem envidando esforços para vacinar a população.

“Quanto à eventual obrigatoriedade da vacina, trata-se de uma muito excepcional possibilidade, cuja implementação não é, não pode ser automática”, defendeu. “A União já assumiu compromisso público de proporcionar gratuitamente imunizantes contra a Covid-19”, afirmou Levi. “Não há exclusão de nenhuma vacina que venha a se demonstrar segura.”

Procuradoria-geral

Em seguida, o procurador-geral da República, Augusto Aras, afirmou que o Estado não pode coagir fisicamente o indivíduo a ser vacinado, mas pode aplicar restrições para incentivar o cidadão a se vacinar.

Segundo ele, essa é uma competência da União. Para Aras, os estados poderiam determinar a vacinação obrigatória, apenas em caso de omissão do governo federal, mas não os municípios.

“Assim como o voto é obrigatório, nem por isso os eleitores são capturados para comparecer às urnas. A vacinação obrigatória não significa condução coercitiva ou emprego de força física”, disse Aras. “Não se vislumbra inconstitucionalidade na vacinação obrigatória.”

“Numa situação de epidemia nacional, de pandemia, que alcança todo planeta e que coloca em risco a saúde da coletividade, é razoável que o direito individual ceda em prol do direito de todos. A imunização em massa, portanto, é medida que prevalece.”

O procurador-geral também defendeu que, “havendo evidência científica, a vacina deve ser providenciada pelo poder público” e que cabe ao governo federal coordenar a política de vacinação compulsória.

“Divergências políticas eventuais não podem prejudicar a efetivação do direito de toda a população brasileira”, disse Aras.

O que dizem as ações

Em uma das ações, o PDT pede que seja reconhecida a competência de prefeitos e governadores de decidir sobre uma eventual vacinação obrigatória e outras medidas profiláticas no combate à pandemia da Covid-19, “desde que as medidas adotadas, amparadas em evidências científicas, acarretem maior proteção”.

O partido entrou com a ação após declarações do presidente da República, Jair Bolsonaro, de que a vacinação contra o novo coronavírus não será obrigatória no Brasil.

Segundo a legenda, a vacinação compulsória já está prevista na lei que disciplina as medidas excepcionais de enfrentamento da pandemia, sancionada pelo presidente em fevereiro.

“Omitindo-se a União em seu dever constitucional de proteção e prevenção pela imunização em massa, não pode ser vedado aos Estados a empreitada em sentido oposto, isto é, da maior proteção, desde que amparado em evidências científicas seguras”, diz o texto da ação.

Em outra ação, o PTB quer a suspensão do trecho da mesma lei que dá poder a autoridades públicas de determinar a vacinação compulsória da população.

O partido afirma que a própria lei prevê que as medidas “somente poderão ser determinadas com base em evidências científicas e em análises sobre as informações estratégicas em saúde e deverão ser limitadas no tempo e no espaço ao mínimo indispensável à promoção e à preservação da saúde pública”.

Segundo a legenda, a obrigatoriedade coloca “em grave risco a vida, a liberdade individual dos indivíduos e a saúde pública da coletividade”.

“Neste momento inicial, inexiste segurança quanto aos efeitos colaterais das vacinas e nem certeza quanto à sua eficácia contra o Covid-19, já que assumidamente diversas etapas obrigatórias para a segurança de vacinas deixaram de ser realizadas”, afirma o partido.

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