Governo prevê corte de até R$ 20 bi para cumprir teto em 2021

 O aumento de despesas obrigatórias, principalmente por causa da alta da inflação, deve levar o Ministério da Economia a fazer um corte de R$ 10 bilhões a R$ 20 bilhões no Orçamento do próximo ano, segundo integrantes da pasta.

Esse é um cálculo preliminar da tesourada que o governo terá de adotar para cumprir em 2021 o teto de gastos — regra fiscal que impede o crescimento das despesas públicas acima da inflação.

Portanto, com arrocho nos desembolsos, o ministro Paulo Guedes (Economia) pretende preservar o teto, considerado por ele a principal âncora fiscal do país.

A inflação acelerou no segundo semestre. O limite máximo para as despesas foi reajustado com base no índice até o primeiro semestre (2,13%, acumulado de 12 meses encerrados em junho). Mas a expectativa do mercado é que o IPCA (índice oficial de inflação) suba para cerca de 4,4% no fim do ano.

Esse descompasso pressiona o Orçamento de 2021, que terá de ser ajustado para manter os gastos dentro do teto, R$ 1,485 trilhão. O valor do salário mínimo, por exemplo, terá de ser corrigido de R$ 1.067 por mês, cálculo de agosto, para R$ 1.088 ou mais (a depender da inflação de dezembro).

Guedes, apesar da pressão sobre o teto em 2021, tem garantido que o limite será cumprido. Para ele, se essa regra for flexibilizada, haverá fuga de investidores, comprometendo a retomada da economia.

Por isso, técnicos do Ministério da Economia analisam a proposta de Orçamento do próximo ano para remanejar despesas e discutir de quais áreas precisará tirar verba para acomodar o aumento de despesas obrigatórias, como aposentadorias e benefícios sociais.

O ajuste terá de ser feito em diálogo com o Congresso, que, por causa de disputa política, ainda não votou o Orçamento de 2021. A previsão é que o projeto seja analisado em fevereiro, após a eleição dos novos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado.

“Hoje o teto é um sinal de proteção das classes mais baixas, dos mais pobres. O teto diz o seguinte: nós não vamos deixar voltar a inflação, não vamos deixar o juro alto, estagnação econômica, corrupção generalizada. O governo tem de fazer escolhas”, disse Guedes, na semana passada, durante balanço de sua gestão em 2020.

O corte estudado para o Orçamento significa retirar dinheiro de alguns ministérios para que o governo possa cumprir seus compromissos.

A LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2021, que traça os rumos do Orçamento, já foi alterada na semana passada e passou a prever uma queda nas despesas discricionárias, que englobam gastos com energia elétrica, água, terceirizados e materiais administrativos, além de investimentos em infraestrutura, bolsas de estudo e emissão de passaportes, por exemplo.

A despesa para manutenção da máquina pública caiu de R$ 92,052 bilhões, valor estimado em agosto, para R$ 83,932 bilhões, montante atualizado em dezembro.

Esse valor, no entanto, pode subir porque geralmente deputados e senadores usam suas verbas de emendas no Orçamento para investimentos e gastos que são considerados discricionários.

Mas a equipe econômica ainda refaz cálculos de outras áreas para que, com previsões mais precisas para alguns programas, possa haver abertura de espaço no teto.
A principal pressão no aumento de despesas vem da indexação. Gastos públicos estão atrelados à inflação.

O exemplo mais citado por técnicos do governo é a revisão na projeção de salário mínimo, para R$ 1.088. Isso se deve ao cálculo do reajuste, que considera a inflação, sem previsão de ganho real.

O valor exato do novo piso nacional é geralmente decidido nos últimos dias do ano. Assim, o governo tem um panorama mais claro da inflação em 2020 para, então, reajustar o salário mínimo.

O índice usado para corrigir esse valor é o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor). O governo previu 4,2%.

Até novembro, o INPC acumula alta de 3,93%. A expectativa do mercado financeiro, segundo boletim do Banco Central, é próximo de 4,8%.

Portanto, é possível que o salário mínimo tenha de subir ainda mais. Isso eleva as despesas públicas e deixa o cenário de corte no Orçamento, por enquanto, indefinido.

Segundo dados do governo enviados no projeto de LDO, um aumento de 0,1 ponto percentual no INPC aumentaria em R$ 720,8 milhões a despesa pública (já descontando o aumento na arrecadação previdenciária provocado pela reajuste maior do piso salarial).

O governo também precisará considerar mais R$ 4,9 bilhões em gastos previstos para o próximo ano por causa da prorrogação da desoneração da folha de pagamentos para 17 setores da economia.

O teto de gastos, reforçam membros da equipe econômica, não impede que despesas inesperadas sejam realizadas ao longo do ano.

Assim, mesmo com a regra de controle fiscal, o Ministério da Economia admite que poderá ter de mandar mais dinheiro para o Ministério da Saúde no começo de 2021 no combate à Covid-19.

Esse instrumento é previsto na Constituição e permite que essas despesas fiquem fora da trava fiscal. Os chamados créditos extraordinários devem ser usados no começo do ano caso o recente aumento no número de mortes e casos de coronavírus seja de curta duração, e não represente uma segunda onda da pandemia.

Na elaboração do Orçamento de 2022, o cenário esperado pelo governo é outro: deve haver cerca de R$ 40 bilhões de folga. O repique da inflação no fim de 2020 só irá corrigir o limite de despesas para 2022, elevando o teto em ritmo provavelmente maior que o a ser registrado pelos preços dos produtos no país em 2021.

Projeção da dívida pública é reduzida para 91% do PIB

O governo reduziu a previsão de dívida pública do país em 2020 de 93,3% para 91% do PIB (Produto Interno Bruto). Ainda assim, o endividamento deve fechar o ano em patamar recorde, por causa do aumento de despesas para combater o coronavírus.

A dívida bruta do governo geral reúne todos os débitos do governo federal, dos governos estaduais e dos governos municipais, com o setor privado, setor público financeiro e instituições internacionais.

O corte na previsão se deve à revisão do PIB de anos anteriores, pelo IBGE, o que acaba afetando os cálculos da dívida bruta. A alta de 1,1% para o ano de 2018 foi revisada para 1,8%. Para 2019, a revisão foi de 1,1% para 1,4%. Para os dois primeiros trimestres de 2020, os novos números são de queda de 1,5% e recuo de 9,6% cada. A divulgação anterior apontava quedas de 2,2% e de 9,7%, respectivamente.

Os indicadores de endividamento, então, recuaram de maneira geral após o novos dados do IBGE.

Diante do novo cenário, a equipe econômica diz que fica afastada a projeção de alguns analistas de que a dívida chegaria a 100% do PIB em 2020.

“Um valor [91% do PIB], claro, que requer atenção e estamos fazendo isso diretamente. Isso mostra exatamente a outra face às mazelas da Covid-19, mas é um número muito abaixo de 100% [do PIB]”, disse o secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues nesta terça-feira (22).

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