Sem insumo chinês, Butantan e Fiocruz vão interromper produção de vacinas

O Instituto Butantan interrompeu a produção da Coronavac por falta de insumos para a vacina da covid-19. Segundo o governo João Doria (PSDB), entraves diplomáticos motivados pela postura da gestão Jair Bolsonaro têm atrasado a liberação do produto pela China e não há data de novos envios. Já a Fiocruz, responsável pelo imunizante Oxford/AstraZeneca, anunciou que vai interromper a produção por “alguns dias” na próxima semana à espera de insumos também vindos da China – a previsão de entrega é no dia 22.

As paralisações comprometem a vacinação no País, que já sofre com a escassez de doses.Como novas remessas foram entregues nos últimos dias, os efeitos negativos no ritmo da campanha devem se agravar após algumas semanas. Problemas na entrega da Coronavac já atrasaram a segunda dose em diversos Estados.

Ontem, o Butantan entregou o último lote, de 1,1 milhão de unidades, antes de parar todas as etapas da linha de produção por falta de matéria-prima. Para maio, o instituto previa entregar ao Ministério da Saúde 12 milhões de doses, mas reduziu a previsão para pouco mais de 5 milhões.Segundo Doria, Pequim não liberou 10 mil litros de insumos que estão prontos, que correspondem a cerca de 18 milhões de vacinas. “Todos sabem que temos um entrave diplomático, fruto de declarações inadequadas, desastrosas, feitas pelo governo federal contra a China, contra o governo da China e a própria vacina”, disse.Bolsonaro insinuou este mês que os chineses fazem “guerra química com o coronavírus”.

Em abril, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse em reunião, sem saber que era gravado, que a China criou o vírus, mas desenvolveu vacinas piores que os americanos. No mesmo dia, o embaixador da China, Yang Wanming, reagiu à declaração no Twitter, dizendo que a “Coronavac representa 84% das vacinas aplicadas no Brasil”, sem citar Guedes.Presidente do Butantan, Dimas Covas afirmou que só será possível cumprir o cronograma de maio se os insumos chegarem “muito rapidamente”.

A entrega do primeiro contrato com o ministério, de 46 milhões de doses, teve atraso de 12 dias.Em janeiro, o Butantan já havia sofrido com dificuldades na liberação de matéria-prima e também culpou Bolsonaro. Para Covas a liberação do insumo para a Fiocruz cria a expectativa de que o Butantan consiga o mesmo em breve.Chefe do programa paulista de imunização, Regiane de Paula disse que o cronograma anunciado está mantido, mas as demais fases podem ter ritmo mais lento. “Esperamos que o governo federal se sensibilize com todos os brasileiros e tome as atitudes que deve tomar.”Procurada, a Embaixada da China não se manifestou até 20h50. O Itamaraty disse que “as conversas entre os dois governos continuam avançando e há boas perspectivas de recebimento de novo lote de IFA (ingrediente farmacêutico ativo) da China no curto prazo”.Segundo o secretário executivo do Ministério da Saúde, Rodrigo Cruz, a pasta conseguiu “zerar” a falta de doses para a segunda dose da Coronavac.

“Pedimos levantamento para todos os Estados e municípios e o déficit era de 2 milhões de doses. Mandamos 4 milhões.”OxfordA Fiocruz ainda não interrompeu a produção, mas prevê ter matéria-prima só até “meados da próxima semana”. Depois, a produção para “por alguns dias”, até chegar o material dia 22. O último lote recebido pela fundação foi quase um mês antes, em 24 de abril. Outro lote é previsto para 29 de maio.

A Fiocruz disse que os lotes “têm chegado continuamente” e as duas remessas de maio garantem entregas semanais de doses até a terceira semana de junho. A farmacêutica AstraZeneca, disse a Fiocruz, “vem atuando diretamente” com o fabricante na China e autoridades locais, com “apoio” da diplomacia brasileira e da Saúde.“Esperamos que, com a vacinação, comece a se controlar a pandemia, como nos Estados Unidos, que estão tirando máscaras, e Israel, quase sem covid. Mas estamos vacinando com ritmo lento, não temos independência de fabricação, dependemos de IFA da China”, diz Mônica Levi, da Sociedade Brasileira de Imunizações.Fonte: Exame