Mais uma funcionária da CBF denuncia Rogério Caboclo por assédio

A CBF recebeu mais uma denúncia de assédio sexual contra o presidente afastado da entidade, Rogério Caboclo. Uma ex-funcionária que lidava com o dirigente declarou, num documento de seis páginas ao qual o GE teve acesso, ter sido agredida física e psicologicamente por Caboclo. O dirigente nega as acusações.

O relato da ex-funcionária chegou à CBF na quarta-feira, anexado a uma notificação extrajudicial de natureza trabalhista. O documento cita casos ocorridos entre 2017 e 2019 – ano em que ela deixou de trabalhar na entidade.

– O Rogério me expôs inúmeras vezes. Começou com jantares profissionais, em reuniões ele tentava me abraçar e me beijar, entre outras tentativas de me agarrar à força. Foram muitas ocasiões. Ele tentou desde me pedir em casamento em sua sala enquanto Diretor Executivo de Gestão, à total insanidade com os assédios físicos os quais descrevo abaixo. Ele não aceitava não como resposta.

Em nota (leia a íntegra ao fim desta reportagem), a defesa de Rogério Caboclo informou que o dirigente “nega veementemente” a acusação e diz que a funcionária recebeu proposta de dois diretores da CBF, Gilnei Botrel e Manoel Flores, para prejudicar Caboclo.

Botrel e Flores foram procurados pela reportagem e, em nota, “negaram qualquer ação” perante a ex-funcionária para prejudicar o presidente afastado. Eles afirmaram que a posição da defesa de Caboclo “se trata de estratégia diversionista e falaciosa do ex-presidente diante das novas acusações de extrema gravidade”. O advogado da funcionária também foi procurado após a nota da defesa de Caboclo. Se houver resposta, esta reportagem será atualizada.

A CBF afirmou que “tomou conhecimento dos episódios narrados na data de ontem [19 de agosto de 2021], mediante o recebimento de denúncia formal encaminhada pelos advogados da ex-funcionária, e remeteu o expediente de imediato à Comissão de Ética do Futebol Brasileiro”.

Após o recebimento da denúncia, a Comissão de Ética abriu uma nova investigação. O primeiro caso, que foi revelado pelo ge no dia 4 de junho e resultou no afastamento de Caboclo, está em fase final. Uma Assembleia Geral foi marcada para a próxima quarta-feira, dia 25 de agosto. Os 27 presidentes de federações estaduais vão decidir o futuro de Rogério Caboclo.

No total são três mulheres que afirmam ter sido assediadas por Rogério Caboclo. Além das duas que fizeram denúncias formais, uma ex-funcionária da entidade declarou ao Ministério Público que sofreu assédio – mas ela não quis formalizar denúncia.

Agressão no apartamento

De acordo com a denúncia da funcionária, houve diversos casos de agressões físicas e psicológicas.

– Ele me agrediu muito, as agressões físicas doeram, eram agressões no nível emocional e psicológico, sofri muito, gritei muito, chorei todas as lágrimas possíveis. Decidi que nunca mais passaria por isso e resolvi sair da CBF – diz um trecho do documento.

Um dos casos, segundo a funcionária, ocorreu em fevereiro de 2018, no apartamento de Caboclo, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro.

– Quando chego em sua casa, com meu computador ele tranca a porta, me oferece vinho, digo que não […] Aí então ele saiu, foi para outro lado do apartamento dele. Quando ele voltou com o que me parecia shorts de banho, ele tentou me beijar, puxou meu cabelo para trás com muita força, e tentou me beijar novamente. Eu pedi para ele parar e ele não parou.

O relato prossegue:

– Ele então me pegou pelo pescoço contra [a] parede e forçou a sua mão entre as minhas pernas, tentando ao mesmo tempo enfiar a mão dentro da minha calcinha. Tentei revidar empurrando com o cotovelo e ele fez mais força no meu pescoço. Ele me largou por sorte a comida que ele havia pedido chegou.

Em seguida, sempre segundo o relato da ex-funcionária, chegou ao apartamento de Caboclo o então secretário-geral da CBF, Walter Feldman, que também participaria da reunião. Ela relata ter contado ao dirigente o que havia acabado de sofrer. De acordo com a denúncia, Feldman teria minimizado o episódio e dito a seguinte frase: “Entenda, todo gênio é um pouco louco”.

Procurado nesta sexta-feira pela reportagem, Feldman afirmou não se lembrar do episódio.

Restaurante

Outro episódio narrado no documento apresentado à CBF teria ocorrido no dia 27 de agosto de 2017 num restaurante do Leblon, no Rio de Janeiro.

– Durante o almoço, ele saiu para o banheiro, quando voltou se sentou ao meu lado, segurou a minha perna e cintura, tentou me dar um beijo. Eu disse Rogério, por favor, não faça isso. Ele continuou tentando. Pedi a conta, e por sorte tinha o telefone do seu motorista, [que] estava por perto aguardando.

Convites para viagens

Segundo o relato da ex-funcionária, em pelo menos três ocasiões Rogério Caboclo pediu a ela para acompanhá-lo em viagens, sem que ela tivesse um papel profissional definido. Uma delas seria para Miami, para acompanhar uma reunião com um patrocinador da CBF. Outra seria para Zurique, sede da Fifa. E a terceira para Porto Alegre, num jogo contra o Equador pelas Eliminatórias para a Copa de 2018. Nas três ocasiões, ela se recusou a viajar.

Ligações durante a madrugada

No documento, a denunciante afirma que, com frequência, Caboclo lhe enviava mensagens e fazia ligações durante a madrugada questionando “por onde anda”, “bem linda?”, “vai deixar eu mandar em você?”. Algumas dessas ligações ocorreram, segundo o relato, após situações em que ela havia se negado a ceder aos seus assédios.

Ela narra que, em uma das ligações destacadas pela ex-funcionária, ocorrida em abril de 2019, Caboclo “telefonou oferecendo dinheiro para falar de sexo com ele ao telefone. Ofereceu R$ 15 mil e disse que não era a última oferta dele”, escreveu, informando ter desligado o telefone na sequência.

A primeira denúncia contra Caboclo

No dia 4 de junho, uma funcionária da CBF protocolou denúncia de assédio sexual e moral contra Rogério Caboclo. O documento foi entregue à Comissão de Ética da CBF e à Diretoria de Governança e Conformidade.

Entre os fatos narrados por ela, estão constrangimentos sofridos por ela em viagens e reuniões com o presidente e na presença de diretores da CBF. Na denúncia, a funcionária detalha o dia em que o dirigente, após sucessivos comportamentos abusivos, perguntou se ela se “masturbava” – o áudio desta conversa foi revelado pelo Fantástico em 6 de junho. Entre outros episódios, segundo a funcionária, Caboclo tentou forçá-la a comer um biscoito de cachorro, chamando-a de “cadela”.

Dois dias depois da denúncia, em 6 de junho, Caboclo foi afastado da presidência da CBF por 30 dias, por determinação da Comissão de Ética do Futebol Brasileiro. Na ocasião, a entidade informou que o processo seguiria em sigilo. O presidente afastado nega as acusações. Em 3 de julho, a Comissão renovou o afastamento de Caboclo por 60 dias.

Leia a nota da defesa de Rogério Caboclo

“O presidente da CBF, Rogério Caboclo, repudia as acusações levianas e falsas lançadas contra ele e nega veementemente que tenha cometido atos que configurem assédio em relação à mencionada funcionária da entidade.

Ocorre que, durante o processo do afastamento ilegal de Caboclo do cargo, ele recebeu áudios de diálogos da acusadora e de sua mãe em conversa com um colaborador da CBF (nota da reportagem: o interlocutor é Ricardo Trade, o Baka, que não é funcionário da confederação, mas se apresenta como uma pessoa que quer ajudar Caboclo). Elas relatam de forma clara o recebimento de proposta para prejudicar Rogério Caboclo e retirá-lo definitivamente do comando da entidade. As propostas incluíam oferecimento de alto cargo de direção na CBF, além de R$ 1 milhão.

Essas tentativas de cooptação da funcionária, como comprovam as conversas, foram conduzidas pelos diretores Gilnei Botrel e Manoel Flores, aliados do ex-presidente banido do mundo do futebol e investigado pela Polícia Federal, Marco Polo Del Nero. A defesa de Rogério Caboclo já entrou com pedido de investigação na Comissão de Ética da CBF contra os diretores citados no áudio por suspeita de corrupção de testemunha e contra o ex-presidente da CBF.”

Globo Esporte