Em evento restrito a convidados em São Paulo, o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (MDB-RJ) afirmou não ver motivos para a abertura de um processo de impeachment contra o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por sua conduta durante a pandemia.
Cunha, que perdeu os direitos políticos até janeiro de 2027 devido à cassação na Câmara, faz ofensiva para reverter a sua situação jurídica e afirma que pretende se lançar candidato a deputado federal por São Paulo no ano que vem. Sua filha, Danielle Cunha, deve ser candidata ao mesmo cargo no Rio de Janeiro, reduto eleitoral do ex-deputado.
Ambos autografaram na noite desta segunda (25) edições do livro “Tchau, Querida” (Matrix), no qual ele relata os bastidores do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
O evento aconteceu no teatro da Livraria Cultura da avenida Paulista, com presença de poucas pessoas e sem anúncios na porta do local.
Cunha pretende lançar até o ano que vem outro livro, chamado “Querida, Voltei”, relatando a sua vida desde o momento em que a Câmara autorizou o processo de impeachment até o período atual. Só não sabe se espera o resultado da eleição de 2022 para publicá-lo.
Essa é a segunda noite de autógrafos do livro. A primeira foi em Brasília em junho e, em novembro, haverá outro evento no Rio de Janeiro.
“Não tive o intuito de transformar isso aqui em um evento. É mais basicamente para me colocar”, disse o ex-deputado à reportagem. “Como eu pretendo ser candidato, fazer em São Paulo tem o simbolismo de eu estar presente.”
Ele afirma que não sabe por qual partido se lançaria. Sua filha, diz, não será candidata pelo MDB.
Cunha foi cassado em 2016, após o impeachment de Dilma, por quebra de decoro parlamentar. Ele tem os direitos políticos cassados até 2027 sob acusação de mentir ter “qualquer tipo de conta” no exterior, mas tenta obter uma decisão judicial que derrube o impedimento.
Pivô da queda de Dilma e atualmente defensor de Bolsonaro, Cunha diz não ver motivo para o atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), dar sequência a pedidos de impeachment do presidente.
“Eu não poria [em votação] os pedidos que têm lá, porque eu não vi nenhum deles que caracterizasse um crime de responsabilidade do presidente”, disse ele, acrescentando que só aceitou o pedido contra Dilma quando entendeu que ela praticou um crime em seu segundo mandato.
“Ela mandou um projeto de lei ao Congresso Nacional para mudar a meta fiscal, só que emitiu decretos para gastar sem que essa meta tivesse sido votada pelo Congresso. Aí, ela praticou um crime. Foi só aí que aceitei”, afirmou.
Questionado a respeito do que foi investigado na CPI da Covid sobre o presidente, Cunha afirmou que são apenas “situações de opinião, de comportamento e do que o presidente pensa”.
“Se houve problema no ministério tal, há forma de punição previsível, que será feita se houver algum ilícito que for apontado e comprovado. Não tem um ato do presidente da República. Qual o ato que o presidente praticou no âmbito da CPI que possa ser considerado crime de responsabilidade? Sinceramente, não vi”, afirmou.
“Vi discussão sobre a maneira de visão que ele tem da pandemia, que você ou eu podemos discordar, mas aquilo não caracteriza crime. Eu acho que a situação do Bolsonaro com relação à pandemia vai ser julgada pela população nas urnas.”
Para ele, não houve negligência do presidente na compra de vacinas. “O que me faz ter convicção de que não houve negligência foi o fato de o Brasil ter entrado no estudo da Astrazeneca na frente de todo mundo. Ali já se estava buscando uma vacina muito antes de a [vacina da] Pfizer estar em condições de ser ofertada. Se [Bolsonaro] não tivesse feito nada, talvez tivessem razão. Mas ele tinha feito”, afirmou.
Cunha obteve uma recente vitória no Supremo Tribunal Federal. Em setembro, a corte decidiu enviar à Justiça Eleitoral do Rio de Janeiro ação penal em que ele foi condenado por Sergio Moro por corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.
Caberá ao juiz que receber o caso avaliar se terão validade ou devem ser anuladas decisões de Moro e as provas produzidas durante a tramitação do processo, incluindo a sentença condenatória.
O ex-deputado, porém, tem outras duas condenações criminais em primeira instância, por corrupção e lavagem de dinheiro –uma no Distrito Federal e outra em Curitiba, esta última sentenciada pelo sucessor de Moro, o juiz Luiz Antônio Bonat. Sua defesa recorre das decisões.
Cunha havia sido preso preventivamente em 2016 e obteve liberdade no primeiro semestre desse ano, antes de iniciar a divulgação do livro. Passou a ser um assíduo crítico dos métodos da Lava Jato.
Moro irá se filiar ao Podemos em novembro, o que abre caminho para que possa se tornar candidato a presidente na eleição do ano que vem.
Cunha diz torcer para que ele seja candidato, mas acrescenta que não tem “a menor dúvida” que o ex-juiz será derrotado. “Até apelo que ele seja candidato. Acho muito importante para o Brasil que ele seja candidato, até para poder expor todo o processo político que ele era chefe e mostrar que tudo [a Lava Jato] era uma farsa política”.
“É importante que a gente mostre para o país qual era o objetivo dele. É muito importante que o povo brasileiro julgue isso e que a derrota dele seja suficiente para enterrar essa fase ruim da vida política brasileira”, afirmou.
FolhaPress