Gastos com juros da dívida pública sobem R$ 136 bi em 2021, valor que supera orçamento do Auxílio Brasil

A disparada da inflação no ano passado e o aumento da taxa básica de juros para tentar contê-la não afetaram apenas o bolso dos brasileiros. Esses fatores também geraram um aumento nas despesas com juros da dívida pública pela União — que cresceram R$ 136 bilhões no ano passado.

Somente esse crescimento supera todo o orçamento do novo programa social do governo Bolsonaro, o Auxílio Brasil — estimado em R$ 89,1 bilhões para 2022.

Segundo números divulgados pelo Banco Central, as despesas totais com juros passaram de R$ 312,4 bilhões em 2020 para R$ 448,3 bilhões no último ano, de acordo com dados oficiais.

Esse foi o primeiro aumento nas despesas com juros da dívida pública desde 2015, ou seja, em seis anos. Naquele ano, os gastos com juros avançaram R$ 190,4 bilhões.

De acordo com o BC, essa alta está relacionada, principalmente, com o crescimento da inflação, pois 33% da dívida líquida está atrelada à variação dos preços.

Se a inflação sobe, avança também a despesa com juros. A alta da inflação aumentou as despesas com juros em R$ 87,510 bilhões em 2021.

Além disso, as sucessivas elevações da taxa básica de juros da economia pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, para conter justamente alta dos preços, também impactaram as despesas com juros.

A alta da taxa Selic, que estava em 2% ao ano no fim de 2020 e avançou para 9,75% ao ano no fechamento do ano passado (o maior valor em mais de quatro anos), contribuiu para elevar pagamento de juros em R$ 71,787 bilhões em 2021.

Outro fator que também influenciou as despesas com juros da dívida pública no ano passado foi a desvalorização cambial, mas nesse caso o impacto foi positivo.

O aumento do dólar de 7,47% contra o real em 2021, para R$ 5,5748, gerou mais perdas com os chamados “swaps cambiais” — que funcionam como uma venda de moeda no mercado futuro.

Entretanto, como as perdas do Banco Central no ano passado com esses contratos de “swaps cambiais”, de R$ 22,324 bilhões, foram menores do que em 2020 (40,8 bilhões), houve uma queda de R$ 18,5 bilhões nos gastos com juros nesse item, explicou a instituição.

O argumento da instituição é de que as atuações cambiais visam corrigir distorções de mercado, ou seja, suprir uma demanda dos bancos não encontrada no momento de tensões políticas e econômicas.

Maior que Auxílio Brasil
Somente o aumento de R$ 136 bilhões nos gastos com juros da dívida pública no ano passado supera todo o orçamento do novo programa social do governo Bolsonaro, o Auxílio Brasil — estimado em R$ 89,1 bilhões para 2022.

O espaço para esse gasto foi viabilizado por meio da PEC dos Precatórios, que possibilitou, também, recursos para as emendas de relator, conhecidas como orçamento secreto, o reajuste aos policiais e a elevação do fundo eleitoral.

Se contabilizado o gasto total com juros em 2021, de R$ 448 bilhões, o valor supera os gastos previstos para 2022 com:

Auxílio Brasil (R$ 89,1 bilhões)

Embora os gastos com juros estejam incluídos no orçamento financeiro — ou seja, não são despesas primárias (pessoal, previdência e gastos dos ministérios, entre outros) —, também são contabilizadas na dívida pública.

O governo tem atuado na contenção das despesas primárias, por meio do teto de gastos, justamente para evitar a alta do endividamento.

Equipe econômica
O ministro Paulo Guedes, da Economia, frequentemente compara os gastos financeiros, que envolvem os juros da dívida pública, com os primários.

No fim de 2019, ele observou que a queda da Selic, registrada naquele ano, seria o equivalente a três vezes o valor do antigo Bolsa Família.

“O Brasil reconstrói uma Europa todo ano sem sair da miséria”, declarou Guedes, naquele momento, afirmando que o pagamento de juros tem montante equivalente ao desembolsado pelo Plano Marshall para reconstrução dos países aliados após a Segunda Guerra Mundial.

Em evento virtual nesta semana, Guedes afirmou que o endividamento em bola de neve, registrado ao longo das últimas décadas, é uma irresponsabilidade com futuras gerações.

“De repente você cria um programa social de R$ 10 bilhões [no passado], que era o Bolsa Família, muito meritório, mas pagando R$ 400 bilhões de juros todo ano para os rentistas, 40 vezes o que gastava em transferência para os mais frágeis e vulneráveis. Isso está errado”, afirmou.

Com a alta da inflação e dos juros no ano passado, porém, o setor público voltou a superar a marca de R$ 400 bilhões anuais nas despesas com juros da dívida pública.

Guedes observou, entretanto, que a dívida caiu no ano passado (veja abaixo) e afirmou que é preciso avançar nas privatizações de empresas estatais e na chamada “desalavancagem” de bancos públicos (devolução de recursos ao Tesouro Nacional) para reduzir o endividamento, além de continuar melhorando o resultado das contas públicas.

Dívida bruta cai em 2021
Apesar do aumento das despesas com juros no ano passado, a dívida bruta do setor público, indicador que é acompanhado com atenção por investidores, caiu para 80,3% do PIB em 2021, contra 88,6% do PIB no fim de 2020.

De acordo com o Banco Central, o principal fator que contribuiu para baixar a dívida bruta no ano passado, que contrabalançou o aumento nos gastos com juros, foi o aumento do Produto Interno Bruto.

O resultado do último ano ainda não foi divulgado oficialmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (BGE), mas a previsão do mercado financeiro é de que, após um tombo de 4,1% em 2020, seja registrada uma expansão de 4,5% no nível de atividade no último ano.

Além do crescimento do PIB, outro fator que atuou para baixar o endividamento, de acordo o Tesouro Nacional, foi o recebimento de R$ 75,8 bilhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), dos quais R$ 63 bilhões relativos ao pagamento antecipado de empréstimos.

No passado, o Tesouro chegou a emprestar mais R$ 500 bilhões para o banco público. O saldo devedor da instituição financeira, no fim de 2021, era de R$ 213 bilhões.

O presidente do BNDES, Gustavo Montezano, afirmou recentemente que quer devolver o “mais rápido possível” esses recursos ao Tesouro Nacional, mas que depende de depende de “questões técnicas” para efetuar esse ressarcimento de forma mais acelerada.

g1