Congresso derruba vetos de Bolsonaro, e leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc entrarão em vigor

Em uma derrota para o presidente Jair Bolsonaro, o Congresso Nacional derrubou nesta terça-feira (5) os vetos presidenciais a dois projetos que preveem ajuda financeira ao setor cultural — os das leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc 2.

No caso da Lei Aldir Blanc, deputados deram 414 votos pela derrubada do veto e 39 pela manutenção. Entre os senadores, foram 69 votos a zero contra o veto. Com relação à Lei Paulo Gustavo, o placar foi de 66 a zero entre os senadores, e de 356 a 36 entre os deputados. A própria liderança do governo orientou pela rejeição dos vetos.

A derrubada dos vetos se deu após pressão de atores e produtores culturais, que nos últimos dias participaram de audiências públicas sobre o tema no Congresso.

Os artistas reforçaram a importância das duas leis para a democratização do acesso à cultura e à arte e chamaram os textos de “SUS da cultura”, em referência ao Sistema Único de Saúde.

Para que um veto presidencial seja derrubado, é necessária maioria absoluta dos votos de deputados (257 votos) e de senadores (41 votos) em sessão conjunta.

Por mais de uma vez, os dois vetos haviam entrado na pauta da sessão do Congresso, mas, por falta de acordo, a votação tinha sido adiada.

Antes da análise dos parlamentares, o presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), escreveu em uma rede social que a aprovação das duas leis “demonstrou uma manifestação muito consistente da Câmara dos Deputados e do Senado Federal por essas duas matérias de interesse do setor cultural” e disse que aguardava “o desfecho mais justo possível” na apreciação dos vetos.

No plenário

No plenário, governistas e oposicionistas divergiram sobre as razões que motivaram os parlamentares a derrubar os dois vetos.

Em discurso, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro, disse que o governo fez um “acordo” para derrubada do veto. “Com a derrubada desses vetos, repito, em acordo com o governo, mediante a aquiescência do presidente Bolsonaro, mais uma vez, esse governo entra para história”, disse.

O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), comemorou, classificando a votação de “momento histórico” e dizendo que a Lei Paulo Gustavo “dá o socorro emergencial” e a Lei Aldir Blanc “impõe a distribuição de recursos importantes da cultura no nosso país”.

Dirigindo-se aos artistas, parlamentares de oposição atribuíram o resultado da votação à mobilização da categoria.

“Foi a mobilização de vocês, foi o processo de mobilização que qualificou este debate aqui no Congresso Nacional, para que a gente desse respostas aos problemas da cultura”, declarou o senador Paulo Rocha (PT-PA), autor da Lei Paulo Gustavo.

“A presença de vocês fez este ambiente mudar. Vocês fizeram com que o coração e a consciência dos parlamentares ouvissem o que vocês significam na dimensão mais ampla da cidadania”, afirmou a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), autora da Lei Aldir Blanc.

Os projetos

Aprovada em março deste ano pelos parlamentares, a Lei Paulo Gustavo prevê o repasse de R$ 3,86 bilhões em recursos federais a estados e municípios para o enfrentamento dos efeitos da pandemia da Covid-19 sobre o setor cultural, um dos mais impactados pelas restrições adotadas durante a crise sanitária.

Pelo texto, R$ 2,79 bilhões serão destinados a ações no setor audiovisual e R$ 1,06 bilhão para ações emergenciais no setor cultural. A proposta foi batizada com o nome do ator e comediante Paulo Gustavo, que morreu de Covid-19 em maio do ano passado.

A “nova” Lei Aldir Blanc foi aprovada dias depois e garante o repasse anual de R$ 3 bilhões aos governos estaduais e municipais, durante cinco anos, para que estes financiem iniciativas culturais. A divisão dos recursos será feita da seguinte forma:

  • 80% dos recursos irão para editais, chamadas públicas, cursos, produções, atividades artísticas que possam ser transmitidas pela internet; e ainda para manter espaços culturais que desenvolvam iniciativas de forma regular e permanente;
  • 20% dos recursos serão destinados a ações de incentivo direto a programas e projetos que tenham por objetivo democratizar o acesso à cultura e levar produções a periferias e áreas rurais, por exemplo, assim como regiões de povos tradicionais.

Essa é a segunda lei de auxílio ao setor cultural a receber o nome do letrista e compositor Aldir Blanc, que morreu em 2020 por complicações da Covid.

A primeira, aprovada em 2020, destinou R$ 3 bilhões emergenciais a iniciativas de cultura, em um momento no qual as restrições de circulação impediam a maioria das exibições e espetáculos.

Fontes de recurso

As duas leis estabelecem fontes de recurso para financiar a política de fomento ao setor.

Segundo a Lei Paulo Gustavo, o dinheiro das transferências sairá do superávit financeiro de receitas vinculadas ao Fundo Nacional de Cultura e operado diretamente pelos estados e municípios.

A proposta também autoriza o uso de dotações orçamentárias da União e outras fontes não especificadas no projeto. Ainda, segundo a proposta, o repasse dos recursos pela União deverá ocorrer em, no máximo, 90 dias após a publicação da lei.

No caso da Lei Aldir Blanc, a previsão é que sejam usados:

  • dotações previstas no Orçamento e créditos adicionais;
  • superávit do Fundo Nacional da Cultura apurado em 31 de dezembro do ano anterior;
  • subvenções e auxílios de entidades de qualquer natureza, inclusive de organismos internacionais;
  • 3% da arrecadação bruta dos concursos de prognósticos e loterias federais que tiverem autorização federal, deduzindo-se este valor dos montantes destinados aos prêmios;
  • recursos provenientes da arrecadação da Loteria Federal da Cultura, a ser criada por lei específica;
  • resultado das aplicações em títulos públicos federais.

Razões para o veto

Ao vetar a Lei Paulo Gustavo, o Executivo argumentou que “ao criar a obrigatoriedade do repasse pelo governo federal de recursos provenientes de fundos como o Fundo Nacional de Cultura aos Estados, aos Municípios e ao Distrito Federal, a proposição legislativa enfraqueceria as regras de controle, eficiência, gestão e transparência elaboradas para auditar os recursos federais e a sua execução”.

Além disso, a Secretaria-Geral da Presidência afirmou, na ocasião, que o projeto contrariava o interesse público por criar uma despesa sujeita ao limite do teto de gastos — regra que limita o crescimento da maior parte das despesas públicas à inflação.

Os argumentos para o veto à Lei Aldir Blanc foram semelhantes. Segundo o governo, “ao retirar a autonomia do Poder Executivo federal em relação à aplicação dos recursos, engessaria as possibilidades quanto ao emprego desses recursos para políticas públicas culturais cuja operacionalização depende de fundos e verbas pertencentes ao próprio Poder Executivo”.

g1