Para Benedito, ficou comprovado abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação pela reunião, em que Bolsonaro fez ataques ao sistema eleitoral.
O ministro Benedito Gonçalves votou ontem quinta-feira (27) para condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e deixá-lo inelegível pelo prazo de oito anos. O magistrado é o relator da ação em julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por uma reunião de Bolsonaro com embaixadores em 2022.
Para Benedito, ficou comprovado abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação pela reunião, em que Bolsonaro fez ataques ao sistema eleitoral.
A Corte eleitoral retomou a análise do caso ontem terça-feira (27) com o voto do relator. Demais ministros votarão na quinta-feira (29). Na última quinta-feira (22), se manifestaram os advogados das partes e o Ministério Público Eleitoral (MPE).
Em seu voto, Benedito disse que as provas do processo apontam para a conclusão de que Bolsonaro “foi integral e pessoalmente responsável pela concepção intelectual do evento” com embaixadores.
“Isso abrange desde a ideia de que a temática se inseria na competência da Presidência da República para conduzir relações exteriores – percepção distinta que externou o ex-chanceler ao conceituar a matéria como um tema interno – até a definição do conteúdo dos slides e a tônica da exposição – que parece ter sido lamentada pelo ex-chefe da Casa Civil”, afirmou.
Benedito Gonçalves foi duríssimo nas palavras usadas em seu voto. Ele disse que teorias conspiracionistas e mentiras de Bolsonaro não estão respaldadas na liberdade de expressão e que ele usou redes sociais para incitar dúvidas, insegurança, desconfiança, conspiracionismo e paranoia coletiva.
Os votos dos demais ministros da Corte serão apresentados na sessão de quinta-feira (29). A ordem é a seguinte: Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques e, por último, Alexandre de Moraes.
O ex-presidente é alvo de um processo em que o PDT o acusa de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicações pela reunião com embaixadores no Palácio da Alvorada, em julho de 2022, em que ele fez ataques ao sistema eleitoral. O então candidato a vice-presidente na chapa, Walter Braga Netto, também responde à ação.
O evento
Benedito dividiu seu voto em partes. Ele analisou, primeiro, a realização do evento em si. Sobre o tópico, afirmou ter ficado constatado que a estrutura e o serviço do Poder Executivo foram “rapidamente mobilizados para a viabilizar a reunião”. Para Benedito, a magnitude do evento com embaixadores não se mede pelos custos da atividade.
“Evidentemente, a nota fiscal relativa ao planejamento e à logística no valor de R$ 12.214,12 não é capaz de refletir a inteireza dos recursos públicos empregados sob a forma de bens e serviços na realização do encontro. Além disso, a verdadeira magnitude de evento nem mesmo se estima em dinheiro, seu maior destaque está na solenidade que chamou a atenção até mesmo do ministro das Relações Exteriores, conforme consta em seu depoimento”, declarou.
Conforme o voto do relator, os representantes estrangeiros que foram à reunião assistiram “por mais de uma hora” a uma apresentação em que Bolsonaro fez “elogios” a “si próprio e a seu governo”, críticas à atuação de servidores públicos, “ilações a respeito de ministros” do TSE, além de “supostas conspirações para que seu principal adversário viesse a ser eleito, exaltação às Forças Armadas, defesa de proposta de voto impresso, recusada pela Câmara dos Deputados quase um ano antes e alerta contra a inocuidade das missões de observação internacional”.
“O improvável fio condutor de todos esses tópicos foi a afirmação de que houve manipulação de votos nas eleições de 2018 e que era iminente o risco nas eleições de 2022”, disse Benedito.
Discurso
Sobre o discurso de Bolsonaro, o relator entendeu que o ex-presidente fez uma apresentação “inteiramente distorcida” sobre os fatos que tratou. Entre os temas, Bolsonaro falou sobre um inquérito da Polícia Federal sobre um ataque hacker à Corte eleitoral em 2018.
“[Bolsonaro] afirmou, assim que o TSE teria sido negligente, insidioso diante de uma vulnerabilidade de natureza gravíssima, apta a permitir que os votos fossem adulterados no momento da totalização. Disse mais: que havia interesses de ministros do TSE em manipular o resultado do pleito. Essa narrativa não tem qualquer respaldo documental.”
“As lives de 2021 foram exitosas em sua proposta pragmática de cultivar o sentimento de que uma ameaça grave rondava as eleições de 2022 e que essa ameaça partia do TSE. O conspiracionismo se conservou latente e foi acionado com facilidade no ano eleitoral”.
Conforme Benedito, Bolsonaro usou a reunião para “demarcar sua firme posição em usar redes sociais como meio de difundir dúvidas meramente retóricas e disseminar desconfianças e conspiracionismo”.