Em meio à disputa entre esquerda e direita sobre censura e liberdade na internet, Melissa Fleming, subsecretária-geral da ONU para comunicações globais, é categórica. “É possível regular mantendo a liberdade de expressão”, diz ela.
Fleming vem ao Brasil na semana que vem para participar do evento paralelo ao G20 “Integridade da informação: combate à desinformação, ao discurso de ódio e às ameaças à democracia”.
“Se deixarmos as plataformas cumprirem apenas suas próprias regras, não chegaremos a um ecossistema de informações saudável, porque elas não cumprirão”, afirma.
As Nações Unidas se preparam para lançar seus princípios de integridade de informação, e a subsecretária espera que empresas sigam essas diretrizes, apesar de a organização não ter poder vinculante.
Em entrevista recente, Melissa Fleming destacou a preocupação contínua com a desinformação e o discurso de ódio, especialmente na plataforma X, anteriormente conhecida como Twitter, indicando que os problemas identificados no ano anterior persistem.
“Infelizmente, não parece ter melhorado”, comentou Melissa Fleming, referindo-se à situação das maiores plataformas digitais que, segundo ela, reduziram significativamente suas equipes de moderação e segurança. Ela citou uma pesquisa interna da ONU que revelou que 88% dos funcionários acreditam que a desinformação prejudica significativamente a capacidade de realizar seu trabalho.
A entrevista também abordou o impacto da inteligência artificial e das redes sociais na disseminação de informações falsas. A subsecretária-geral expressou preocupação com o potencial de tais tecnologias exacerbarem os problemas existentes. Ela mencionou o apoio bipartidário nos Estados Unidos para regulamentar a IA, especialmente em relação aos seus efeitos prejudiciais às crianças, e destacou esforços para criar governança global através de conselhos consultivos da ONU.
Quanto à eficácia das regulamentações atuais, Fleming reconheceu os esforços da União Europeia com a Lei de Serviços Digitais, que se concentra na proteção da liberdade de expressão enquanto regula a internet. Ela enfatizou a importância de regulamentações que não se limitem a deixar as plataformas estabelecerem suas próprias regras sem supervisão externa.
Respondendo a uma pergunta sobre a regulamentação como ferramenta de censura por alguns governos, a subsecretária-geral destacou a necessidade de uma abordagem equilibrada que proteja a liberdade de expressão sem comprometer a segurança da informação. Ela referenciou o “teste de três partes” no direito internacional dos direitos humanos para garantir que quaisquer restrições sejam claras, legítimas e necessárias.
Sobre o cenário brasileiro, Melissa Fleming reconheceu o papel de liderança do Brasil na promoção da integridade da informação, especialmente no contexto do G20. Ela mencionou os desafios enfrentados pelo país devido ao domínio das redes sociais como principais veículos de notícias, que muitas vezes levam a caminhos enganosos e perigosos.
A entrevista concluiu com a afirmação de Melissa Fleming sobre a importância de esforços regulatórios combinados com a promoção de conteúdo científico confiável e o apoio à mídia de interesse público, destacando a necessidade de uma abordagem multifacetada para combater a desinformação globalmente.
RAIO-X | MELISSA FLEMING
Americana, é subsecretária-geral da ONU para Comunicações Globais desde setembro de 2019. De 2009 a 2019, foi chefe de comunicações globais do Acnur, agência da ONU para refugiados. É formada em estudos alemães pelo Oberlin College e tem mestrado em jornalismo pela Universidade Boston.
FONTE: Portal Correio