Jovem fotografa fauna da Caatinga no Cariri da Paraíba

Ao sul da Paraíba, na região do cariri paraíbano, existe uma cidade conhecida como a “Roliúde Nordestina”, uma alusão ao distrito norte americano de Los Angeles.

O município de Cabaceiras (PB) ganhou o apelido carinhoso por ser palco de diversos filmes e séries, como o renomado “O Auto da Compadecida”.

Se depender do agricultor Breno Farias, de apenas 21 anos – que também é músico e tem a fotografia como um hobby, a cidade continuará sendo registrada, mas com outro foco.

“Eu tenho uma paixão muito grande pela Caatinga, pois trata-se de um bioma único e exclusivamente brasileiro, além de que me sinto privilegiado por morar nele. A Caatinga possui espécies únicas, totalmente adaptadas a períodos com escassez de água. Na época das chuvas, ver a vegetação brotar e mudar de cinza a variados tons de verde é, pra mim, um colírio aos olhos”, conta.

O suiriri-cavaleiro (Machetornis rixosa) recebe esse nome pelo comportamento de seguir mamíferos grandes para capturar carrapatos e outros parasitas — Foto: Breno Farias/VC no TG
Nascido e criado com os irmãos na zona rural, a natureza sempre fez parte da vida, de modo que o amor pela fauna e a flora surgiu tão natural quanto aprender a falar.

“Eu sempre falo que admiro e sou fascinado por todo tipo de animal, porém, as aves me chamam mais atenção: os diferentes comportamentos, tamanhos, cores e vocalizações me atraem desde pequeno. Lembro bem quando criança, na antiga casa que cresci, ficava observando um casal de casaca-de-couro (Pseudoseisura cristata) que fez ninho em um pé de aroeira-do-sertão (Myracrodruon urundeuva). Achava fantástico o dueto deles sempre que voltavam ao ninho”, conta.

O joão-xique-xique (Synallaxis hellmayri) é uma espécie rara que habita os arbustos baixos e a vegetação rasteira da caatinga — Foto: Breno Farias/VC no TG

O joão-xique-xique (Synallaxis hellmayri) é uma espécie rara que habita os arbustos baixos e a vegetação rasteira da caatinga — Foto: Breno Farias/VC no TG

Apaixonado pelas artes, assim como por desenhos e pela música, o primeiro contato com a fotografia, segundo ele, foi “amor a primeira vista”. “Só que por ser de família humilde, não tinha dinheiro pra comprar uma câmera própria. Até que em 2014 minha irmã e eu ganhamos uma câmera bem simples, mas que de certa forma nos possibilitava fazer fotografias dos mais diversos temas: flores, paisagens, insetos e qualquer animal que permitisse uma aproximação legal. Com o passar do tempo a câmera que tanto nos trazia alegria acabou parando de funcionar”, detalha Breno, que em 2019, depois que a irmã comprou uma super zoom, passou a fotografar com o equipamento emprestado.

“Foi a primeira vez que tive contato com uma câmera com muito zoom e que, diferente das anteriores, não era necessário me aproximar tanto para fotografar animais silvestres. Ela deixava o equipamento comigo uma semana e na outra já pegava de volta, isso pra mim era uma verdadeira tortura, porque eu estava realmente maravilhado com a câmera e queria tê-la sempre em mãos”, brinca. “Mal sabia eu que no ano seguinte (2020) algo incrível aconteceria”.

Breno ganhou de presente do amigo, que também é observador e fotógrafo de aves, Robério Aires, o tão sonhado equipamento, que foi o ponta pé inicial para a fotografia de natureza se tornar um estilo de vida. Dois anos depois outros amigos se juntaram e decidiram comprar uma câmera com mais recursos para presentear o fotógrafo. “Sem dúvidas o melhor presente que poderia ganhar!”.

O inhambu-chintã (Crypturellus tataupa) ocorre desde o Nordeste brasileiro até a Argentina — Foto: Breno Farias/VC no TG

O inhambu-chintã (Crypturellus tataupa) ocorre desde o Nordeste brasileiro até a Argentina — Foto: Breno Farias/VC no TG

Registros favoritos

“Tenho muitos registros, cada um com uma história e emoção diferente, porém sempre temos aqueles preferidos. Um dos que mais gosto é a primeira foto que consegui fazer de um inhambu-chintã (Crypturellus tataupa), ave bastante arisca e difícil de encontrar. Só quem já tentou fotografá-la sabe o quanto é difícil, mas eu estava com sorte e no primeiro dia que tentei consegui uma foto bem legal”, relembra.

O papa-lagarta-cinzento (Micrococcyx cinereus) se alimenta principalmente de insetos e larvas. — Foto: Breno Farias/VC no TG

O papa-lagarta-cinzento (Micrococcyx cinereus) se alimenta principalmente de insetos e larvas. — Foto: Breno Farias/VC no TG

Outro registro inesquecível para o jovem foi o raro papa-lagarta-cinzento (Micrococcyx cinereus). “Essa é uma ave desejada por muitos observadores e fotógrafos de natureza. É bastante discreto e no Brasil existem relativamente poucos registros dessa ave que, assim como o inhambu, me deu a honra de na primeira tentativa conseguir uma das melhores fotos da minha galeria”.

A coruja-orelhuda (Asio clamator) também é conhecida como coruja-gato, coruja-listrada e mocho-orelhudo — Foto: Breno Farias/VC no TG

A coruja-orelhuda (Asio clamator) também é conhecida como coruja-gato, coruja-listrada e mocho-orelhudo — Foto: Breno Farias/VC no TG

O clique preferido, no entanto, não é o de melhor qualidade, mas sim um registro que carrega uma história inesquecível. “Um dos momentos mais emocionantes que tive até hoje foi ficar frente a frente com a maior espécie de coruja que habita a minha região, a coruja-orelhuda (Asio clamator), não só porque era um sonho que eu tinha em registrá-la, mas por todo o esforço que eu e meu pai fizemos para esse encontro acontecer: foram três noites inteiras tentando vê-la, apenas ouvíamos a vocalização. Até que na terceira noite, já um pouco sem esperança de conseguir a foto, ela surgiu. Embora o registro tenha ficado ruim, foi emocionante poder observar e fotografar essa espécie, exatamente as três horas da manhã”, finaliza.

Tatu-peba (Euphractus sexcinctus) também foi registrado pelo jovem — Foto: Breno Farias/VC no TG

Tatu-peba (Euphractus sexcinctus) também foi registrado pelo jovem — Foto: Breno Farias/VC no TG

Ciência cidadã

Embora o hobby de fotografar a fauna da Caatinga tenha começado de maneira despretensiosa, hoje Breno enxerga um propósito no que faz. “Eu sei da importância dos meus registros. Com eles contribui com a ciência cidadã, colaborando com imagens para trabalhos educativos e sites, como Wikiaves. Além disso, de certa forma também consigo levar conhecimento a respeito das espécies que ocorrem na minha região, ajudando na preservação delas, pois acredito fielmente que as pessoas só protegem aquilo que elas conhecem”.

É por isso que ele não abriu mão de também fotografar outros animais, como anfíbios, mamíferos e répteis, e segue tentando conquistar cada vez mais pessoas através das fotos. “Quero fazer todo mundo enxergar nossas belezas naturais, que muitas vezes passam despercebidas aos olhos de muita gente”, completa.

G1 Campinas