Fidelidade a Temer na Câmara cai e fica em 76%; DEM foi mais fiel que o MDB

O DEM, do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ), foi o partido mais fiel ao governo Michel Temer nas principais votações de 2017. A legenda entregou 88% dos votos possíveis da bancada a Temer. Ficou à frente do MDB, do próprio Temer, que deu 86% de apoio, do PTB, com 84%, e do PP, com 83%. Essas foram as siglas que renderam ao presidente pelo menos oito de cada dez votos.

Durante um ano conturbado para a cúpula do Executivo, o apoio da base aliada a Temer ficou em 76% nas 13 principais votações na Câmara em que houve orientação por parte das lideranças governistas. Esse percentual é o mesmo registrado pelo PSDB e pelo PRB, que aparecem empatados na quinta colocação no ranking dos governistas mais fiéis.

Entre as 13 principais votações analisadas estão a reforma trabalhista, a ampliação das terceirizações, a recuperação fiscal dos estados, as duas denúncias criminais contra Temer, entre outras. De todas elas, o governo saiu derrotado apenas uma vez. Faltaram quatro votos para aprovar a proposta de emenda constitucional que previa a cobrança de mensalidade em programas de pós-graduação lato sensu de instituições federais. Ao todo, foram votadas 194 proposições.

O PSD e o PR, que ocupam um ministério cada, foram os mais infiéis. O partido do ministro da Ciência e Tecnologia, Gilberto Kassab (PSD), apoiou o Planalto em 73% das ocasiões. Já o PR, do ministro dos Transportes, Maurício Quintella Lessa, ficou com Temer em 72% das votações.

O índice médio registrado nas principais votações ficou cinco pontos abaixo dos 81% obtidos pelo governo em todas as votações de 2016, segundo levantamento da Revista Congresso em Foco publicado em janeiro do ano passado. Como os dados obtidos no ano passado não consideram todas as deliberações, não é possível fazer uma comparação fiel dos números. O percentual alcançado em 2017 também é superior aos 66% angariados pela ex-presidente Dilma Rousseff em 2015, último ano em que a petista governou do início ao fim.

Apenas 20 deputados governistas estavam presentes e seguiram a orientação do governo em todas as 13 deliberações. Foram eles:

Alceu Moreira (PMDB-RS)
Bilac Pinto (PR-MG)
Cacá Leão (PP-BA)
Celso Russomanno (PRB-SP)
Fernando Monteiro (PP-PE)
Júlio Cesar (PSD-PI)
Luiz Fernando Faria (PP-MG)
Marcus Pestana (PSDB-MG)
Mauro Pereira (PMDB-RS)
Nelson Marquezelli (PTB-SP)
Nelson Meurer (PP-PR)
Nilson Leitão (PSDB-MT)
Nilson Pinto (PSDB-PA)
Nilton Capixaba (PTB-RO)
Pedro Fernandes (PTB-MA)
Rodrigo de Castro (PSDB-MG)
Sergio Souza (PMDB-PR)
Toninho Pinheiro (PP-MG)
Vaidon Oliveira (DEM-CE)
Valdir Colatto (PMDB-SC)

Os mais fiéis

Dos 303 votos possíveis, o DEM entregou 266. Foram anotadas 33 dissidências e quatro abstenções (confira a metodologia da análise dos dados abaixo). O MDB, que tirou o P da sigla no fim do ano passado, aparece em seguida, garantindo 568 vezes dos 660 votos possíveis. Foram 85 “infidelidades” e sete abstenções entre os emedebistas. O PR foi a sigla que mais “traiu” a vontade do governo. Dos 421 votos possíveis, o partido votou 303 vezes conforme a orientação do presidente. Houve 116 deserções entre os colegas do ministro dos Transportes.

Para o analista político Antônio Augusto de Queiroz, diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), apesar do apoio elevado demonstrado pelo levantamento, Temer não tem votos suficientes para aprovar uma emenda à Constituição, por exemplo. “Há de se lembrar que Temer teve de fazer concessões muito significativas a essa base. Emendas parlamentares, liberação de cargos – inclusive à revelia do Judiciário que vem impedindo posse de gente que não preenche critérios da moralidade para assumir. Então, um governo com baixa popularidade com esse índice de aprovação na Câmara só tem uma explicação: é a troca de favores, uma prática fisiológica de trocar votos por favores, cargos ou por recurso”, afirma Antônio Augusto.

Fisiologismo

O cientista político e professor emérito da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer também aponta a relação de troca de favores como a força por trás dos números apontados. Essa fidelidade, pondera, não pode ser considerada real. “É fisiologismo. A fidelidade é trabalhada ou costurada. E se você não tem mais grana para satisfazer as mãos abertas, você perde partidos”, afirma o professor.

O professor do Insper Carlos Melo entende que a questão central é que Temer não tem uma base para aprovar o que realmente deseja sem compensações. É, basicamente, um “achaque” da base, diz Melo. “É dando que se recebe. E se não der, não vota”, acrescenta o cientista político.

Carlos Melo faz uma ressalva sobre a fidelidade da base. Ele lembra que nem todas as matérias de interesse do governo foram votadas porque faltou apoio, como a reforma da Previdência, considerada prioritária pelo Planalto. “O levantamento demonstra a foto e não o filme”, afirma. Melo explica que, quando se faz esse tipo de levantamento, os números se resumem ao que foi efetivamente votado. “No nosso universo não constam aquelas matérias que não tiveram consenso para ser votadas”, observa.

Ele destaca que uma proposta só vai à votação depois que já foi costurada e acordada com a base no Congresso. “Aquelas matérias que não vão à votação nunca vão fazer parte das estatísticas, mas elas existem”, diz o cientista político citando a reforma da Previdência, que o governo luta para aprovar há mais de um ano. Para ele, é preciso levantar quantos projetos de lei o governo enviou, quantos foram votados e, dentre os apreciados, quantos foram aprovados e com que percentual de apoio da base.

A metodologia

Para chegar aos números indicados na reportagem, o Congresso em Foco separou as principais votações do ano e como cada parlamentar da base votou. Entre os 399 deputados e deputadas considerados integrantes da base em 2017, o governo poderia receber 5173 votos de aliados nas votações em que orientou a votação. Foram descartadas, porém, as ausências acumuladas pelos governistas nas deliberações (1131). Na prática, Temer poderia ter até 4042 votos nas votações selecionadas.

Das 14 levantadas pela reportagem, apenas a emenda que garantiu a criação do fundo eleitoral não recebeu orientação do governo, ou seja, cada um pôde votar como quis.  Em 11 das votações orientadas, o governo recomendou à base voto “sim”. Em outras duas, o voto “não”. O Planalto obteve 3052 votos favoráveis à sua orientação. Outros 949 foram divergentes. A soma dos votos que seguiram a orientação do governo nessas 13 votações criou o universo de votos dados de acordo com orientação (3052). A divisão dos votos de acordo com a orientação pelos votos possíveis resultou no percentual de fidelidade geral, de 76%, apontada no levantamento.

Principais votações analisadas pelo Congresso em Foco na Câmara:

Repatriação de recursos não declarados (14 de março)

303 votos favoráveis x 124 contrários

Ampliou de 38 para 120 dias o prazo para declarar recursos no exterior. Os declarantes garantiam anistia de diversos crimes tributários. Foi a segunda rodada da repatriação em um período de um ano. Norma estabeleceu a cobrança de 15% de Imposto de Renda e 20,25% de multa.

Terceirização (22 de março)

231 votos favoráveis x 188 contrários x 8 abstenções

Projeto originário da década de 1990, lei permitiu que empresas pudessem terceirizar também as chamadas atividade-fim (essenciais e específicas para o ramo de exploração da empresa). Também aumentou prazo do trabalho temporário para seis meses, prorrogáveis por outros três.

Pós-graduação paga em universidades públicas (17 de fevereiro / 29 de março)

318 votos favoráveis x 129 contrários x 4 abstenções (1º turno)

304 votos favoráveis x 139 contrários x 2 abstenções (2º turno) – rejeitada

Permitiria que as universidades públicas cobrassem pelos cursos de pós-graduação lato sensu. Foi rejeitada em segundo turno e arquivada.

Recuperação fiscal dos estados (18 de abril)

301 votos favoráveis x 127 contrários x 7 abstenções

Suspende o pagamento das dívidas dos estados com a União por três anos (prorrogáveis por outros três) mediante contrapartida. Os governos estaduais têm de aprovar um plano de recuperação, comprometendo-se a privatizar, congelar reajustes de servidores públicos e não realizar novos concursos.

Reforma trabalhista (27 de abril)

296 votos favoráveis x 177 contrários x 1 abstenção

A base da proposta está na prevalência do negociado sobre o legislado. Texto flexibiliza a jornada de trabalho, permitindo que o empregado trabalhe 12 horas ininterruptas, sem intervalo, em troca de 36 horas de descanso, permite o parcelamento das férias em até três vezes e limita as hipóteses para indenizações por danos morais e patrimoniais. Torna facultativa a contribuição ou financiamento sindical e afasta da Justiça trabalhista a possibilidade de anular acordos e convenções coletivas contrárias à lei.

MP das concessões (2 de maio)

284 votos favoráveis x 99 contrários x 4 abstenções

Permite prorrogação, renovação e repactuação de concessões nos setores de transporte – aeroportos, ferrovias e rodovia – feitas nos últimos 12 anos. Contratos do setor ferroviário contemplem novos trechos ou ramais ferroviários com a extensão necessária para atender polos geradores de carga.

1ª denúncia contra Temer (2 de agosto)

263 votos a favor do presidente x 227 contra – 2 abstenções e 19 ausências

Após a delação premiada do empresário Joesley Batista, o então procurador-geral da República Rodrigo Janot apresentou denúncia contra Temer por corrupção passiva.

Foro privilegiado para Moreira Franco (26 de setembro)

203 votos a favor x 198 contra – 7 abstenções

Temer editou MP recriando a Secretaria de Governo para acomodar Moreira Franco, até então responsável pelo Programa de Parcerias e Investimentos, e livrá-lo do risco de ser julgado pela primeira instância na Operação Lava Jato. Moreira Franco é citado nas delações da Odebrecht e do grupo J&F, da JBS.

Exclusão do Refis para políticos (3 de outubro)

205 votos contra x 164 a favor – 9 abstenções

Estabeleceu regras para refinanciamento de dívidas tributárias de pessoas físicas e jurídicas com a União. Prevê descontos sobre os juros que podem variar de 50% a 90%, conforme a modalidade de pagamento escolhida, e de 25% a 70% para as multas. Dívidas de até R$ 15 milhões terão condições especiais e débitos superiores poderão ser parcelados em 175 vezes. Os deputados rejeitaram uma emenda que excluía políticos do programa de refinanciamento.

Criação do fundo eleitoral (4 de outubro)

223 votos a favor x 209 contra – 3 abstenções

Conjunto de novas regras eleitorais, que passam a valer neste ano. Entre as mudanças, criou-se fundo eleitoral com recursos públicos, no valor estimado de R$ 1,7 bilhão, para financiar campanhas.

2ª denúncia contra Temer (25 de outubro)

251 votos a favor do presidente x 233 contra – 2 abstenções e 25 ausências

Temer foi denunciado, pela segunda vez, poucos dias antes do fim da gestão de Rodrigo Janot à frente do MPF. Temer, Moreira Franco e Eliseu Padilha foram acusados de obstrução da Justiça e organização criminosa.

MP do Fies (31 de outubro)

255 votos a favor x 105 contra 1 abstenção

Cobrança da primeira parcela a ser paga pelo estudante de instituições de ensino privado vinculado ao Fies foi antecipada para o primeiro mês após conclusão do curso. Pagamento  pode ser consignado à folha de pagamento caso o ex-estudante esteja empregado. O saldo da dívida restante deverá ser quitado em mensalidades equivalentes ao maior valor entre o pagamento mínimo e o cálculo do percentual vinculado à renda bruta do estudante ou amortizado e quitado integralmente com redução de encargos.

CARIRI EMC AÇÃO

Com Congresso em foco/Foto: Antônio Cruz/ABr

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