Os números de assassinatos na Paraíba mostram que o percentual de vítimas com idade entre 0 e 18 anos vem crescendo no Estado e que as pessoas estão morrendo cada vez mais cedo. Dados da Secretaria de Estado da Segurança (Seds) mostram que 1.284 pessoas foram assassinadas no Estado, em 2017 e, destas, 11% eram crianças, adolescentes ou jovens. Um percentual crescente em relação ao ano de 2013, por exemplo, quando foram mortas 1.573 pessoas e 10% delas tinha menos de 18 anos. Comparando o percentual e os números absolutos dos dois anos percebe-se claramente que em 2017 morreram mais crianças, adolescentes e jovens. João Pessoa, Campina Grande e Santa Rita são as cidades onde mais morre pessoas nessa faixa etária, com uma larga distância numérica de casos em relação às demais cidades.
Durante o ano de 2017, 145 pessoas com idade entre 0 e 18 anos foram assassinadas no Estado. A violência urbana fica evidente nos crimes, uma vez que, do total de homicídios, 86% foram praticados com arma de fogo. Apenas 12 foram por arma branca e 9 com uso de outros instrumentos como veneno e fogo. A maioria dos crimes com arma branca se concentra nas cidades do interior.
A maioria dos crimes que atingem jovens e adolescentes tem relação com tráfico de drogas ou rixa entre facções criminosas. Mas nem sempre a vítima tinha envolvimento com alguma dessas coisas. Foi o caso do adolescente Anderson Lucas Gonçalves Coutinho, de 16 anos, morto dentro de um ônibus que faz o transporte coletivo da Capital. Na madrugada do dia 20 de fevereiro, ele voltava de um bloco carnavalesco, sentado em uma das primeiras poltronas do ônibus, onde outros jovens que estavam na parte de trás, gritavam o nome de uma facção criminosa.
Ao passar pelo Bairro dos Novais, bandidos que estavam no lado de fora e que integravam a facção rival, ouviram os gritos de apologia ao bando inimigo e começaram a perseguir o ônibus. Obrigaram o motorista a parar, entraram pela porta da frente e atiraram na primeira pessoa que viram. Anderson estava nas cadeiras da frente, foi atingido na cabeça e morreu no coletivo. A família disse que ele não tinha inimigos.
Ocorrências
▶ Outro caso de destaque em 2017 foi a chacina de sete adolescentes, durante uma rebelião no Lar do Garoto, em Lagoa Seca, instituição de internação para cumprimento de medica socioeducativa. Seis morreram queimados e um foi decapitado. Outro caso de destaque foi o envenenamento de uma adolescente e duas crianças, na cidade de Itabaiana. Uma agricultora foi presa, acusada de cometer os crimes e ainda aguarda julgamento.
▶ Entre os anos de 2013 e 2017 houve uma variação de -18% em ralação ao número total de homicídios.
▶ Dados de janeiro a maio deste ano, mostram um total de 503 homicídios, sendo 39 na faixa etária entre 0 a 18 anos de idade.
Casos são frenquentes
O ano de 2018 ainda nem terminou e os dados sobre os assassinatos só serão conhecidos em 2019, se houver divulgação. Mas os casos de mortes de crianças, adolescentes e jovens já se espalham pelo Estado. Foi o que aconteceu em João Pessoa, com o caso do menino Guilherme Marinho, de 7 anos, que esteve desaparecido durante cinco meses e, somente há duas semanas, a polícia confirmou que foi vítima de um assassinato.
A polícia ainda trabalha para esclarecer a motivação do crime, mas já sabe que Guilherme era apenas um menino, que gostava de brincar com os vizinhos. Não tinha sequer idade para se envolver com o crime, mas o pai tinha um histórico com o tráfico de drogas e isso pode ter sido o suficiente para que criminosos tirassem a vida do menino.
A família tinha esperança de encontrá-lo vivo, porque haviam boatos de que pudesse estar em pode de traficantes da comunidade rival. Em junho, a polícia encontrou uma ossada, dentro de uma mata, que fica perto da comunidade Taipa, onde mora a família do menino. Um mês depois, o exame de DNA confirmou que os restos mortais eram de Guilherme e outro exame constatou que ele foi morto com uma pancada na testa.
Se as suspeitas se confirmarem, Guilherme foi morto porque o pai, então integrante da facção que comanda o tráfico de drogas no bairro do Grotão, teria rompido com o grupo e se aliado aos rivais, que dominam o tráfico na comunidade Taipa. O pai do menino cumpre pena em um dos presídios da Capital e a mãe, Valdenice Marinho, disse que o marido vivia recebendo ameaças dentro do presídio, de que o garoto seria morto.
Faltam oportunidades
Para o doutor em Ciência Política e professor de Ciências Sociais da Universidade Federal da Paraíba, José Artigas de Godoy, são vários os motivos que estão levando os jovens à morte cada vez mais cedo. Mas o principal deles é a falta de oportunidades para qualificação e pouca ou nenhuma chance de colocação no mercado de trabalho.
“O desemprego no Brasil hoje é de 13%, mais de 14 milhões de pessoas. Mas se fizermos um recorte só com a população jovem, o desemprego sobe para 20% no País e alarmantes 50%, no Nordeste. Com o tráfico de drogas oferecendo uma alternativa de renda, é natural que esse jovem vá para o crime e que, com isso, haja um aumento dos assassinatos”, explicou.
A oferta de renda e a falta de oportunidades têm atraído pessoas cada vez mais jovens para o tráfico, onde o jovem, adolescente ou até a criança são objetos úteis e descartáveis, segundo Artigas. “O jovem tem uma agilidade natural da idade, é difícil de ficar preso, por conta da legislação que rege os atos infracionais de adolescentes, mas quando acontece qualquer problema, é assassinado por criminosos ou pela polícia e rapidamente são substituídos”, acrescentou.
As mortes geralmente acontecem em confrontos de grupos rivais, disputas pelo controle de territórios ou em ações policiais e ainda por vingança da família, mesmo a criança não tendo envolvimento com o tráfico.
Interiorização
A comparação entre os dois anos pesquisados mostram a interiorização dos crimes contra jovens e crianças, com uma sensível mudança de números em relação à localização dos assassinatos. Em 2013, a Região Metropolitana de João Pessoa concentrou 66% dos assassinatos, enquanto em 2017, essa região teve 46% dos homicídios contra o público pesquisado. Os dados parciais de homicídios em 2018, referente aos cinco primeiros meses do ano, mostram a Região Metropolitana de João Pessoa com 31% dos casos, ficando o restante dos casos espalhados pelas cidades do interior.
Investimentos
O sociólogo também atacou as políticas de segurança pública e de combate às drogas que, segundo ele, têm mostrado resultados errados e desastrosos, com aumento exponencial da violência.
Essa semana o Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgou a edição 2017 do Anuário, que reúne estatísticas gerais da segurança no Brasil e Estados. De acordo com o documento, em 2016 a Paraíba investiu em inteligência policial só 0,018% do gasto total com segurança pública. Em 2017, o investimento caiu para 0,017%.
O investimento em inteligência é 31 vezes menor que o gasto com policiamento ostensivo.
Secretário culpa tráfico
Para o secretário de Segurança da Paraíba, Cláudio Lima, a mortalidade crescente de crianças e jovens tem foco na sedução do tráfico de drogas e na falta de políticas públicas de inclusão, em caráter nacional.
“É de fato um conjunto de fatores. Um deles é o jovem ou adolescente estar entrando cada vez mais cedo no tráfico, no uso de drogas e recebendo influências de facções criminosas. Por outro lado, o País não foi capaz de investir em políticas públicas de inclusão dos jovens nas escolas e no trabalho”, disse.
Correio da Paraíba/Foto: Reprodução
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