Na tarde da última quarta-feira (31), quem passasse pelo corredor das comissões da Câmara dos Deputados ouvia gritos à medida em que se aproximava do plenário oito, local marcado para a votação do projeto Escola Sem Partido.
“Abaixo a lei da mordaça!”, gritavam manifestantes contrários ao texto, com cartazes ligados a movimentos como UNE e CUT.
Enquanto isso, no plenário da Casa, deputados da oposição se apressavam em marcar presença para atingir o mínimo de 257 deputados para abrir a ordem do dia, a sessão de votação que derruba todos os outros trabalhos na Câmara.
A combinação resultou no adiamento da reunião que analisaria o relatório favorável à proposta, uma bandeira da bancada evangélica que tem o apoio do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL).
A estratégia demonstra como deve ser o processo de atuação da oposição no Legislativo. Com cerca de 150 deputados, apostará em táticas de obstrução, aliadas a protestos de movimentos sociais, para tentar travar a pauta conservadora.
Segundo o líder do PT, Paulo Pimenta (RS), a decisão de como agir é tomada dia a dia. “No caso do Escola Sem Partido, era importante dar presença para fazer cair a sessão da comissão. Em outros, evitamos dar quorum”, diz.
O chamado “kit obstrução” é amparado pelo regimento da Câmara e consiste em manobras para segurar votações.
Os deputados podem, por exemplo, deixar de registrar presença para evitar que se atinja o número mínimo necessário para se iniciar uma sessão.
Ou apresentar sucessivos requerimentos de procedimentos, que devem ser analisados antes de se chegar ao mérito do projeto. Podem ainda utilizar o máximo de tempo de fala a que têm direito, para alongar a sessão até a madrugada, testando a paciência dos colegas.
Além do PT, o PSOL também é favorável à tática. Ambos os partidos defendem a formação de uma “frente ampla” contra Bolsonaro.
“Temos disposição de construir unidade para defender direitos”, diz o presidente do PSOL, Juliano Medeiros.
O partido, que costuma trabalhar solo na Casa, às vezes em oposição até a outros do mesmo campo ideológico, diz que estaria disposto a agir em conjunto com figuras e parlamentares de fora da esquerda contrários à agenda de Bolsonaro.
Deputados ouvidos pela Folha dizem que pode haver, por exemplo, convergência no combate às políticas ambientais do PSL em partidos como Rede, PV e membros de siglas como o PSDB.
“Houve um amadurecimento do PSOL como partido, e o segundo turno é a prova disso. Foi a primeira vez que o partido apoiou um candidato à Presidência [Fernando Haddad, do PT], e a decisão foi tomada quase por unanimidade”, afirma Medeiros.
Representantes do partido se reuniram nesta semana com quadros do PT para começar as discussões sobre oposição a Bolsonaro.
De outro lado, porém, um bloco que se forma entre PDT, PSB e PC do B pode atrapalhar a estratégia.
Em entrevista após a primeira reunião das siglas, na terça (30), o líder do PDT, André Figueiredo (CE), disse que os partidos querem fazer “oposição propositiva” e e que não irão “obstruir por obstruir”.
O encontro, para o qual não foram convidados os líderes de PT e PSOL, causou mal estar com essas legendas.
“O que é oposição propositiva? Isso é como se a resistência espanhola tivesse tentado encontrar um ponto em comum na agenda do [ditador Francisco] Franco”, disse Pimenta.