A Associação de Magistrados Brasileiros (AMB) pediu ao ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), que não revogue as liminares de sua autoria que garantem o pagamento de auxílio-moradia a juízes e procuradores de todo o País. E que, se cassar o benefício de R$ 4,3 mil, seja impondo um “regime de transição” para não haver uma perda brusca nas remunerações.
O fim ou a limitação do polêmico benefício, concedido até para quem já tem imóvel próprio na cidade onde reside, são uma possibilidade colocada como contrapartida em meio à negociação pelo reajuste do salário dos ministros do Supremo que tem sido conduzida por Fux e pelo presidente do Supremo, Dias Toffoli, com autoridades do Executivo e do Legislativo.
Aprovado no início do mês pelo Senado, o reajuste salarial de 16,38% tem como prazo final para sanção ou veto presidencial a próxima quarta-feira, 28. Nas articulações em andamento em Brasília, Fux já sinalizou que, se o reajuste for aprovado, as liminares que garantem o auxílio-moradia podem ser revogadas. Essa possibilidade motivou a Associação dos Magistrados Brasileiros a apresentar esta nova petição ao Supremo nesta sexta-feira, 23.
O advogado do órgão sustenta que é possível haver tanto o reajuste quanto a manutenção do pagamento do auxílio-moradia. Ao argumentar que uma coisa não deveria anular a outra, afirma também que deve ser evitada qualquer redução nominal ou real da remuneração atual. Uma preocupação adicional é quanto à possibilidade de os magistrados sejam obrigados a pagar impostos ou mesmo devolver os vencimentos recebidos a título de auxílio-moradia, que não é tributado atualmente.
“Eventual decisão de revogação da liminar deverá observar, por exemplo, a norma contida no parágrafo único do art. 21 da LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) no sentido de que não se pode ‘impor aos sujeitos atingidos ônus ou perdas que, em função das peculiaridades do caso, sejam anormais ou excessivos’”, afirma a AMB.
Esta é a segunda vez que a Associação de Magistrados do Brasil apresenta petições que, de alguma maneira, vão no sentido de impedir um novo pronunciamento do Supremo Tribunal Federal diferente daquele que o ministro Luiz Fux deu em 2014, quando concedeu as liminares ainda vigentes, que dão, junto com resoluções do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, dão sustentação para o pagamento, que formalmente precisaria da aprovação de uma lei no Congresso Federal regulamentando-o.
Foi a AMB que, em março, na semana do julgamento das ações que discutem o auxílio-moradia, pediu a retirada da pauta de última hora e o encaminhamento à Advocacia-Geral da União para a abertura de uma Câmara de Conciliação e Arbitragem. A justificativa era a tentativa de se alcançar um acordo, o que no meio jurídico era reconhecido como improvável uma vez que o pagamento só pode ser regularizado mediante a edição de lei. Três meses depois, na véspera do receso do Judiciário, a AGU devolveu as ações ao Supremo informando que não houve acordo.
Logo que o Judiciário voltou às atividades, em agosto, começaram as articulações para a concessão do reajuste salarial por parte do Legislativo e do governo federal tendo o auxílio-moradia como moeda de troca.
O cenário atual é de expectativa, no Judiciário, que o reajuste salarial seja sancionado por Temer. Mas, apesar de o presidente ter sinalizado isso, ainda não tomou a posição. Um elemento de preocupação entre as associações de magistrados e entre os ministros do Supremo que estão tratando do tema foram as declarações do presidente eleito, Jair Bolsonaro, de que é contra a concessão do reajuste para não comprometer o orçamento em 2019. Bolsonaro disse que Temer é “responsável e sabe o que fazer”.
Nesse cenário de impasse, o vice-presidente da Corte, Luiz Fux, apareceu de surpresa na quarta-feira no comitê de transição de governo para conversar com Bolsonaro. A visita foi feita fora da agenda de Fux e de Bolsonaro. O Supremo não informou o motivo da visita. Questionado pela reportagem, por meio da assessoria de imprensa, o gabinete de Fux disse que não faria comentário.
O fato de o plenário de o Supremo Tribunal Federal não ter julgado ainda se o pagamento é constitucional ou não gera um desgaste para todo o judiciário, na avaliação do ministro Marco Aurélio Mello.
A cada mês que passa, os cofres públicos continuam despendendo pelo menos R$ 139 milhões por mês só de auxílio-moradia, de acordo com um estudo da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados. Desde março, quando o julgamento das ações sobre o tema foi abortado na véspera do julgamento, o valor somado é de R$ 1,1 bilhão.
Por outro lado, o aumento no salário dos ministros do Supremo aprovado pelo Senado, de 16,38%, se sancionado por Temer, elevará dos atuais R$ 33,7 mil para R$ 39,2 mil o salário de magistrados e procuradores e poderá custar R$ 4,1 bilhão às contas da União, em razão do efeito cascata em Estados.
Estadão